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Água e gênero

18 de Maio de 2017, por Instituto Rio Santo Antônio

O conceito de gênero é comumente utilizado para se referir à questão da diferença sexual. Ele faz alusão à construção inteiramente social das atribuições dadas aos homens e às mulheres dentro de uma comunidade, em contraposição à sua aparente determinação físico-biológica. Dessa forma, falar de gênero é falar de mulheres, de homens e da relação entre ambos.

A conferência que marcou o início das discussões internacionais mais amplas sobre recursos hídricos foi a Conferência das Nações Unidas para a Água, realizada em Mar del Plata na Argentina, em 1977. O princípio mais importante estabelecido foi o do direito de todos ao acesso à água potável, em quantidade suficiente. Já na terceira Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, a Rio+10, realizada na África do Sul em 2002, o documento intitulado “Metas do Milênio” apresentou algumas questões vinculando a mulher ao meio ambiente, fornecimento de água potável e acesso ao saneamento, principalmente entre as populações marginalizadas.

A ligação feminina com a água é laboral e biológica, uma vez que a mesma está presente em nossas vidas desde a gestação, a exemplo do líquido amniótico que envolve o filho no ventre da mãe. Curiosamente, cerca de 70% do corpo humano é água. Historicamente, as mulheres são as principais gestoras dos recursos naturais em nível familiar, em especial da água. Em termos laborais, elas representam mais da metade da mão de obra agrícola do mundo, especialmente nas zonas rurais dos países em desenvolvimento. E nessas regiões, as mulheres ainda têm a responsabilidade de buscar água, gerenciar o saneamento em nível doméstico e educar as crianças em matérias higiênicas.

No Brasil, em áreas mais pobres, notadamente as rurais, as mulheres são responsáveis pelo gerenciamento da água dentro de casa e nas plantações próximas às residências, garantindo, assim, a sustentabilidade do recurso dentro do ambiente familiar. Cabe destacar também as comunidades indígenas, nas quais as mulheres exercem um papel central na questão hídrica. Dessa forma, o trabalho e o saber femininos são essenciais à preservação e utilização da água e à proteção da biodiversidade na agricultura e no meio ambiente.

Atualmente, a maioria absoluta das moradias urbanas possui rede pública de abastecimento de água, como é o caso de Resende Costa. Mas, há poucas décadas atrás, o privilégio de ter água encanada era só para os moradores do centro da cidade. No entanto, o volume, captado principalmente em um poço localizado na Fonte dos Cavalos, não era suficiente para atender à demanda. A distribuição era realizada pela Prefeitura, substituída pela Copasa no princípio dos anos 80.

E a residência que não era contemplada com a água encanada? E quando faltava água na rede? As fontes que rodeavam a cidade “salvavam a pátria”. Delas provinha a água para todos os afazeres: beber, lavar vasilhas, tomar banho. Algumas dessas fontes eram ainda utilizadas para lavar roupas. E aí entravam em cena as mulheres: as lavadeiras e as carregadeiras. Essas últimas carregavam as latas de água na cabeça, apoiadas em uma rodilha de pano. Particularmente, tenho lembranças de ver algumas lavadeiras na fonte Biquinha, situada nos fundos da Rua Moreira da Rocha. Lembro ainda dos bambuzais, da água limpa e das amoras que cresciam ao longo dos trilhos. Hoje, o local está totalmente deteriorado e sem acesso público. A água virou esgoto e a bica de pedra foi destruída. Realidade compartilhada também pelas outras fontes.

Tanto nas cidades quanto nas áreas rurais, muitos dos afazeres domésticos que envolvem água ainda são realizados predominantemente por mulheres. No entanto, com o empoderamento das mulheres, a situação vem se transformando. Cada vez mais elas têm se inserido na esfera pública, no mercado de trabalho e na gestão, participando de cooperativas, conselhos, Comitês de Bacia. Enfim, não só na área dos recursos hídricos, estamos caminhando para uma sociedade que almeja a participação equitativa de homens e de mulheres nas decisões, nas tarefas e nas responsabilidades. 

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