Cadeia Pública de Resende Costa


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André Eustáquio e Emanuelle Ribeiro0

Cadeia Pública de Resende Costa, localizada no bairro do Tijuco. (Foto Emanuelle Ribeiro)

Uma conquista importante para a Comarca e que necessita de maiores investimentos do Estado

Na manhã do dia 27 de junho, o JL visitou a Cadeia Pública de Resende Costa para a elaboração desta reportagem especial. Nos arredores da cadeia, inaugurada no fim de 2008, reina o sossego típico de uma cidade pequena do interior e muito diferente do clima de tensão que existe no entorno da maioria dos presídios de outras cidades. Muros altos, uma guarita e um único portão de acesso proporcionam sobriedade ao edifício localizado no bairro do Tijuco. Quando chegamos ao local, o caminhão da Coleta Seletiva de Lixo da Prefeitura Municipal aguardava os detentos que participam do programa coordenado pela Assistência Social do município. Os presos saíram em fila, acompanhados pelos agentes penitenciários. Para os detentos escolhidos pelo juiz da Comarca para participarem do Programa Coleta Seletiva estava iniciando mais um dia de trabalho.

Durante muitos anos a cadeia de Resende Costa funcionou nas dependências do quartel da Polícia Militar, na Rua José Jacinto, centro da cidade. Duas celas abrigavam os detentos, que cumpriam suas penas em situação extremamente precária. “Quando eu vim para Resende Costa, em 1998, nós tínhamos uma masmorra que era ali no pelotão da PM. Não tinha estrutura nenhuma para ser cadeia: duas celas, a parte elétrica era uma coisa horrível, vivia dando curto circuito e a ligação era a mesma da PM. Os presos tomavam banho frio e não tinha banho de sol. As visitas eram feitas em frente às celas, sem nenhuma privacidade”, disse o juiz de direito da Comarca de Resende Costa, Donizetti Nogueira Ramos (leia entrevista com Dr. Donizetti no Jogo Aberto desta edição, páginas 4 e 5).

Devido à escassez de espaço, Dr. Donizetti transferia os presos de pena maior para presídios em outras cidades do Estado, deixando em Resende Costa somente os condenados a cumprir penas mais baixas. Desde 1998, a construção de uma nova cadeia tornou-se prioridade para o juiz, que enfrentou muitos obstáculos até ver o prédio concluído: “O Estado sempre colocava obstáculo. Depois de muita insistência, fui a Belo Horizonte, muitas vezes por minha conta; inclusive, paguei do meu bolso a primeira planta para a cadeia. Na época do prefeito Gilberto, conseguimos marcar uma reunião com o secretário de Defesa Social, fomos lá e fizemos um acordo. A Prefeitura entraria com a mão de obra, eu cederia os presos para completar e o Estado bancaria o material que era o mais pesado. Com isso foi feito o convênio em 2006 e em 2007 a obra teve início”.

 

A estrutura da Cadeia

Cinco celas abrigam a população carcerária da Comarca de Resende Costa, que atualmente conta com 25 detentos, sendo cinco albergados e 16 condenados. Cinco agentes penitenciários trabalham na cadeia, que é gerenciada pela Polícia Civil. O diretor da cadeia, delegado Cláudio Geraldo de Oliveira, chama a atenção para o fato de a SUAPI (Superintendência de Administração Penitenciária) ainda não ter assumido a gerência da cadeia. De acordo com ele, a ausência da SUAPI na Comarca compromete o bom funcionamento da cadeia e ainda sobrecarrega a Polícia Civil: “A Polícia Civil está gerenciando a parte administrativa e operacional da cadeia. Mas desde 2011, os investigadores não exercem mais nenhuma atividade relacionada à cadeia, como escolta de presos e auxílio durante visitas e banhos de sol, uma vez que entraram com um mandado de segurança. Essas atividades têm sido feitas pela Polícia Militar”, disse Dr. Cláudio, que também entrou com uma ação contra o Estado: “Entrei com a ação contra o Estado para deixar o cargo de Diretor de Cadeia. Fiz concurso para ser delegado, não diretor de cadeia”, disse o delegado.

Cada preso tem direito a uma televisão e rádio dentro das celas. As visitas acontecem uma vez por semana, nas quartas-feiras, e os detentos podem ainda jogar futebol no pátio da cadeia. “Se o preso cometer algum ato de indisciplina, ele perde esses direitos”, informou o diretor. Dr. Cláudio destaca a disciplina na cadeia e a atribui ao bom trabalho realizado pelos agentes penitenciários: “Os agentes cobram muita disciplina e com isso conseguimos manter a ordem. Nunca houve nenhum problema grave de indisciplina”.

Dos 25 detentos sob a custódia da Comarca de Resende Costa, 16 já foram condenados e cumprem pena na cadeia local. “Os 16 condenados deveriam cumprir pena numa penitenciária do Estado. Cadeia pública é destinada àqueles presos que ainda aguardam julgamento. O ideal é que ao serem julgados e condenados, os presos fossem imediatamente transferidos para uma penitenciária”, disse Dr. Cláudio, que informou ter recebido do Núcleo de Gestão Prisional da Polícia Civil uma solicitação de informações sobre todos os presos condenados, para fins de transferência para alguma penitenciária.

A Cadeia Pública de Resende Costa é considerada uma das melhores da região, apesar dos problemas oriundos da ausência da SUAPI. “Na região, em termos de estrutura física, é a melhor. Falta a SUAPI assumir para aumentar o quadro de funcionários e, assim, poder desvincular totalmente a Polícia Civil que, por lei, não tem obrigação de gerenciar a cadeia”. É função da Polícia Civil investigar crimes, cumprir mandados de prisão, cuidar de registros civis, expedir Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e registrar veículos automotivos. “É interessante observar que o efetivo atual da SUAPI é o dobro do efetivo da Polícia Civil, ou seja, no Estado existem mais funcionários para cuidar de presos do que para investigar crimes”, observa Dr. Cláudio Oliveira, que é um dos 11 delegados da Delegacia Regional de São João del-Rei, responsáveis pelas delegacias das 18 cidades que pertencem à regional e, ainda, pelo cumprimento de uma escala de plantões.

 

Vale a pena apostar na ressocialização

Ademar Trindade de Oliveira, 45 anos, natural de Coronel Xavier Chaves, está preso há cinco anos na Cadeia Pública de Resende Costa, condenado por homicídio. Ademar é um dos presos de melhor comportamento, por isso, foi escolhido para conversar com o JL. Ele trabalha há três anos na Coleta Seletiva. O trabalho permitiu a remissão de sua pena e, de acordo com ele, tem também colaborado para a sua ressocialização: “Gosto muito deste trabalho, especialmente por me proporcionar um convívio mais próximo com a população”. Ademar divide uma das cinco celas da cadeia com mais quatro detentos, que também participam do programa. Estes detentos trabalham de segunda a sexta-feira, das 8 às 16h.

Diferentemente dos presos que classificam os presídios como verdadeiras “sucursais do inferno”, Ademar elogia a estrutura da cadeia de Resende Costa e atribui a ela o fator decisivo para a sua recuperação. “A estrutura daqui é muito boa. Eu tive que cair aqui para refletir sobre o que eu estava fazendo da minha vida. Estar aqui foi uma oportunidade que Deus me deu para mudar. Foi um momento de virada na minha vida. Hoje sou outra pessoa”.

Quem atravessa o portão de entrada não imagina estar dentro de uma cadeia, conforme se vê em vários lugares do Brasil. Mesmo em algumas cidades próximas a Resende Costa é comum constatar presídios sujos e bastante deteriorados. A cadeia pública de Resende Costa é diferente. A limpeza e a organização são exemplares, não se ouve gritaria e não se sente nenhum clima de tensão dentro e no entorno dela. “Em momento algum me senti em perigo aqui dentro”, disse Ademar.

O uso abusivo de drogas e o álcool levaram Ademar a perder o controle de suas ações e, mais grave ainda, a praticar um crime que o levou a cumprir uma pena de 12 anos em regime fechado. Ele se diz arrependido do que fez e afirma ser hoje uma pessoa diferente: “Minha família é grande e trabalhadora, sempre trabalhei, até mesmo para comprar bebidas. Eu me arrependo muito do crime que cometi. As drogas e o álcool me prejudicaram muito, mas hoje sou outra pessoa, a minha mente é outra”. Os anos na cadeia possibilitaram a Ademar refletir sobre seus atos cometidos no passado, aprender com eles e, a partir disso, planejar um futuro melhor: “Quero voltar para a minha casa, ajudar minha mãe e trabalhar para ter algo na vida.”.

 

Perguntar a um presidiário se ele é feliz é algo praticamente inconcebível, uma vez que estamos diante de uma pessoa que teve sua liberdade cerceada, foi colocada em um ambiente tenso, distante da família e dos amigos. Porém, a tranquilidade que Ademar transmite hoje, o seu testemunho de mudança radical de vida e os planos para a construção de um futuro melhor, permitiram que essa pergunta surgisse naturalmente. A resposta de Ademar veio convicta, afirmativa e sem demora: “Sou feliz! A paz que tenho hoje, eu nunca tive. Só penso em coisas boas. A cadeia transformou a minha vida. Antes eu era muito fechado, hoje convivo melhor com as pessoas, sou mais comunicativo. Até a convivência com meus familiares mudou cem por cento. Hoje os meus familiares têm o prazer de conviver comigo. Sou uma pessoa transformada”.

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