“Devemos ir ao encontro daqueles que mais necessitam”

Dom José Eudes Campos do Nascimento fala ao JL sobre a participação dos leigos na Igreja, a Campanha da Fraternidade 2019 e sua nomeação como bispo diocesano de São João del-Rei


Entrevistas

André Eustáquio0

Dom José Eudes Campos do Nascimento, bispo diocesano de São João del-Rei, durante celebração eucarística na igreja matriz de Resende Costa (Foto Camila Silva)

No dia 12 de dezembro de 2018, após quase um ano vacante desde a morte de dom Célio de Oliveira Goulart em janeiro, a Diocese de São João del-Rei recebeu a notícia da nomeação de seu novo bispo. Os sinos das igrejas da histórica cidade do Campo das Vertentes tocaram festivos. O mesmo ocorreu em diversas paróquias que fazem parte da diocese. Em Resende Costa, ouviu-se pela manhã no dia 12 o som do sino da igreja Matriz de Nossa Senhora da Penha de França. Dom José Eudes Campos do Nascimento, 52 anos, era anunciado bispo de São João del-Rei.

Nascido em Barbacena no dia 30 de abril de 1966, dom José Eudes iniciou sua caminhada religiosa na Congregação Salesiana, período em que teve seu primeiro contato com a cidade de São João del-Rei. Ordenado bispo no dia 15 de setembro de 2012 em Barbacena, dom José Eudes tomou posse na Diocese de Leopoldina, na Zona da Mata, em 30 de setembro do mesmo ano. “Fiquei nessa missão na Diocese de Leopoldina até o dia 12 de dezembro de 2018, quando fui nomeado bispo para a Diocese de São João del-Rei”, conta o religioso. Curiosamente, trata-se do terceiro bispo de São João del-Rei que tem passagem por Leopoldina. Dom Delfim Ribeiro Guedes e dom Célio Goulart também foram bispos da diocese da Zona da Mata mineira.

O quinto bispo da Diocese de São João del-Rei, criada em 21 de maio de 1960 pelo Papa São João XXIII, concedeu entrevista ao JL e falou sobre sua trajetória vocacional, sua expectativa para a diocese, a participação dos leigos na Igreja, entre outros temas. Leia abaixo a entrevista de dom José Eudes, que completou 24 anos de vida sacerdotal e tem como lema episcopal “Servus in charitate”: “Servo no amor”.

 

Como o senhor descobriu que era vocacionado ao sacerdócio? Desde pequeno senti o chamado de Deus para o sacerdócio. Gostava de ajudar nas celebrações como coroinha, ir às procissões, fazer novenas. Cada dia crescia mais a vontade de servir a Jesus Cristo.

 

A partir daí, como foi que o senhor iniciou sua formação religiosa? Iniciei meus estudos de formação na Congregação dos Salesianos, realizando o aspirantado em Cachoeira do Campo em 1983. Terminada essa etapa, fui encaminhado para a casa dos Salesianos em Pará de Minas, onde permaneci durante quatro anos até concluir o Ensino Médio no Colégio Sagrado Coração de Jesus, entre 1984 e 1987. Fiz um ano de Filosofia em São João del-Rei, em 1988, na Faculdade Dom Bosco. No ano seguinte, fui acolhido por dom Luciano Mendes de Almeida para uma experiência vocacional na Arquidiocese de Mariana, onde continuei meus estudos de Filosofia no Instituto Santo Tomás de Aquino (ISTA), de 1989 a 1990. Terminando os estudos de Filosofia, fui para o Seminário São José, da Arquidiocese de Mariana, para fazer o curso de Teologia, entre 1991 e 1994. Fui ordenado Diácono no dia 15 de agosto de 1994, em Mariana, e exerci meu diaconato na Paróquia Nossa Senhora da Conceição, na cidade de Congonhas. E, no dia 22 de abril de 1995, fui ordenado sacerdote em minha terra natal, Barbacena.

O senhor disse que teve uma passagem por São João del-Rei nos anos preparatórios ao sacerdócio. Como foi esse primeiro contato com a cidade que agora o recebe como seu novo bispo? No ano de 1988, fiz o primeiro ano de Filosofia na Faculdade Dom Bosco, aqui em São João del-Rei. Nesse ano pude conhecer as celebrações realizadas aqui e participar delas. Participei muito na Paróquia de São João Bosco e o nosso trabalho pastoral era feito no oratório Dom Bosco. Tive a oportunidade de ajudar em uma Semana Santa no Caburu (São Gonçalo do Amarante), experiência muito enriquecedora.

Como foi sua nomeação para a Diocese de São João del-Rei? No dia 09 de novembro de 2018, recebi um comunicado do Núncio Apostólico Dom Giovanni d’Aniello, informando-me que o Santo Padre o Papa Francisco havia me nomeado Bispo da Diocese de São João del-Rei, devendo ficar sob sigilo Pontifício até a data da publicação, que ocorreu no dia 12 de dezembro de 2018.

O senhor teve uma acolhida festiva em São João del-Rei, sendo saudado por centenas de fiéis e religiosos na Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar e no Largo do Rosário. Qual foi sua sensação ao ter o primeiro contato com o povo e com a diocese? Senti a acolhida de todos como um pai que recebe o abraço de seus filhos. Tudo foi muito bem preparado, senti o carinho em cada detalhe e senti nos olhares, nos sorrisos e nos abraços de cada um a alegria de estar recebendo o novo Pastor. Como foi marcante a acolhida pelos padres e religiosos e religiosas da diocese!

Desde que tomou posse, o senhor visitou todas as paróquias da diocese. Como foram essas visitas? O senhor já conhecia um pouco da Diocese de São João del-Rei? Essas visitas foram momentos marcantes, preciosos para estar em contato com as pessoas que fazem parte da diocese; conhecer, estar perto, abraçar. Como diz o Papa Francisco: “O Pastor tem que sentir o cheiro das ovelhas.” E este foi o meu primeiro desejo: conhecer aqueles a quem Deus me confiou. Foram momentos inesquecíveis, de demonstração de muita fé, espiritualidade, de vivência do amor fraterno. Já conhecia São João del-Rei, pois, além de ter estudado um ano na Faculdade Dom Bosco, tivemos encontro de Confraternização dos padres da Província (Juiz de Fora, Leopoldina e São João del-Rei) aqui na cidade. E por ser muito amigo de dom Célio, fiz a ele algumas visitas.

A Igreja conta hoje com grandes desafios, especialmente no campo da pastoral. Quais são suas prioridades para o trabalho pastoral na Diocese de São João del-Rei? A Diocese de São João del-Rei já tem as suas prioridades pastorais, que foram escolhidas na Assembleia Diocesana. Venho para dar continuidade a esses trabalhos já existentes, que tão bem foram conduzidos pelo nosso querido dom Célio.

O Papa Francisco tem insistido muito no que ele chama de “Igreja em saída”, ou seja, uma aproximação maior da Igreja com o povo. O Concílio Vaticano II já conclamava a Igreja para essa ação. A Igreja ainda tem dificuldades de se aproximar do povo? Acredito que a Igreja está cada dia se aproximando mais do povo, visto que a Igreja é o próprio povo. Nós, pastores que conduzimos a Igreja, estamos intimamente ligados às pessoas pela nossa fé. “Uma Igreja em saída” significa que Jesus Cristo está onde o povo está. Devemos ir ao encontro daqueles que mais necessitam, daqueles que estão desamparados, não só econômica, mas, sobretudo, espiritualmente. Acolher o outro é estar perto, ajudar, vivenciar de fato o Evangelho de Jesus Cristo.

Outro pedido do Papa Francisco é que a Igreja capacite os leigos e os insira ativamente nas pastorais. Como o senhor avalia a participação dos leigos na Igreja? Leigos e leigas são o sal da terra e a luz do mundo. O ano de 2018 foi dedicado ao laicato. Estudamos e promovemos muitas ações para conscientizar todos quanto à participação dos leigos na Igreja e na sociedade.

O senhor tem projetos para incentivar a participação dos leigos na Diocese de São João del-Rei? Já pude constatar através das visitas feitas às 42 paróquias como os leigos e leigas são engajados e comprometidos. Só posso aqui incentivá-los cada vez mais a que assumam realmente na Igreja o seu precioso papel, pois, a partir do Batismo, são chamados a serem discípulos e missionários de Jesus Cristo.

Diversas dioceses têm instituído o Diaconato Permanente, ou seja, em sua maioria, homens casados que se ordenam diáconos para exercerem esse ministério nas paróquias e comunidades. O senhor pretende implantá-lo em São João del-Rei? Preciso conhecer primeiro a realidade de toda a diocese

As vocações religiosas e sacerdotais vêm sendo uma grande preocupação da Igreja, tanto no que diz respeito à escassez quanto à qualidade da formação. Como o senhor pretende trabalhar as vocações na diocese? As vocações sacerdotais e religiosas são as pupilas de todos os bispos, pois são dessas vocações que teremos religiosos(as) e sacerdotes para servir à Igreja e ao seu povo. A qualidade da formação, a meu ver, só tem melhorado. Tem-se trabalhado nos nossos seminários a formação humana, espiritual, doutrinal, pastoral e missionária.

A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) escolheu “Políticas Públicas” como tema da Campanha da Fraternidade 2019. Qual a finalidade dessa escolha? O tema da Campanha da Fraternidade deste ano, “Fraternidade e Políticas Públicas”, que tem como lema: “Serás libertado pelo direito e pela justiça” (Is 1,27), quer chamar a atenção de cada um de nós para o direcionamento de políticas públicas que promovam a libertação de todos à luz da Palavra de Deus e da Doutrina Social da Igreja. É necessário fortalecer a cidadania e o bem comum, sinais de fraternidade. Refletir sobre políticas públicas é importante para se entender a maneira pela qual elas atingem a vida cotidiana e o que pode ser feito para que sejam efetivadas, e também para acompanhá-las com uma boa fiscalização, pois, só assim serão aprimoradas.

Como a Igreja pode colaborar para um debate profícuo sobre a política no Brasil? Quando cheguei à Diocese de São João del-Rei, reuni-me com os prefeitos e os vereadores dos 25 municípios que compõem a diocese e propus a eles que estudem o texto base da CF nas Câmaras de vereadores e que nossas autoridades coloquem em prática as diversas propostas de ações que a Campanha da Fraternidade nos sugere. Propus também que nossas seis foranias e todas as paróquias, nossas pastorais, movimentos, irmandades, confrarias estudem e divulguem bem a Campanha da Fraternidade deste ano.

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