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Mundo ao meu redor: pós-verdade ou pós mentira?

19 de Fevereiro de 2017, por José Venâncio de Resende

Terreno pertencente ao grupo Epa, em área de grande concentração de supermercados.

Leio que, no mundo ao norte da América, o dono do facebook Mark Zuckerberg resolveu investir na “informação verdadeira”, principalmente depois da polêmica sobre as eleições norte-americanas, o que deve fortalecer o papel da imprensa que leva as coisas a sério. Ele admite que a popular rede social tem promovido “desinformação e até mesmo conteúdo enganoso”. Nua e cruamente, o facebook tem divulgado notícias e conteúdo falsos que inclusive teriam influenciado na eleição de Donald Trump.

Enquanto isso, Trump, em sua primeira entrevista coletiva à imprensa, voltou a acusar os jornalistas de desonestidade. "O público já não acredita mais em vocês", vociferou.

Vamos continuar com a “pós-verdade”, da qual é expoente o grande manipulador dos fatos Donald Trump, ou vamos viver a “pós-mentira” com o facebook se redimindo?

Aqui no mundo micro, mais especificamente em São João del-Rei, observam-se mudanças no setor supermercadista. Circulam soltos na cidade rumores sobre a destinação a ser dada ao terreno da Avenida Leite de Castro que pertencia ao Posto Vianini e foi adquirido pelo Epa Supermercados, de Belo Horizonte. Afirma-se, com alguma convicção, de que o Epa vai aproveitar o espaço para instalar unidades de varejo e atacado em São João del-Rei, entrando na concorrência com as demais redes de supermercados que atuam na cidade como Bahamas, Salles, Bergão, Esquinão e Agostinho.

Na dúvida, consultei a área de marketing do grupo DMA Distribuidora, ao qual está ligado o Epa, que não confirmou qualquer empreendimento em São João del-Rei relacionado com varejo e atacado. Assim, até informação ao contrário, não há perspectiva de instalação do Epa em São João del-Rei.

Por outro lado, o Bahamas Supermercados de Juiz de Fora – que possui loja de varejo em São João del-Rei - está investindo na ampliação das atividades do grupo na cidade. Em breve, o Bahamas deverá inaugurar uma unidade de atacado – o chamado “atacarejo” – na saída da cidade (rodovia Lavras/Barbacena), que deverá ter abrangência regional. Atacado que já vem sendo explorado pelo supermercado Bergão na av. Leite de Castro. 

Ainda no mundo doméstico, não poderia deixar de abordar a questão do transporte interestadual, mais especificamente a linha de ônibus entre Barbacena e São Paulo/Campinas, passando por São João del-Rei. Não raro, ouvimos dizer que “com a Gardênia eu era feliz e não sabia”, numa referência ao Expresso Gardênia que rodou nesta linha por vários anos. Nem tanto ao céu nem tanto à terra!

De qualquer forma, os serviços da Viação UTIL tem deixado muito a desejar. O tempo de viagem aumentou, chegando-se a levar mais de 10 horas entre São Paulo e São João del-Rei em veículos com espaços cada vez mais apertados entre os bancos, aumentando o desconforto.

Outro exemplo é o tratamento dado aos idosos. Presenciei uma cena estarrecedora no guichê da empresa, em São Paulo. Uma mulher queria comprar duas passagens para idosos que viajariam um mês depois. O funcionário da empresa respondeu de imediato: “Não temos passagens gratuitas”. “Mas eu não quero passagens gratuitas, quero aquelas de 50% do valor.” “Esta passagem é só para ônibus convencionais, não vendemos para ônibus executivo.” “E qual a diferença entre ônibus convencional e executivo?” “A mesma coisa, o mesmo tipo de ônibus!” Não esperei pelo fim do diálogo, mas é importante lembrar que os ônibus convencionais, mais baratos, são cada vez mais raros. Além disso, o funcionário – com pose de dono da empresa – em nenhum momento consultou o terminal de computador para responder às perguntas da mulher.

Na verdade, é maléfico este modelo adotado em que o país é loteado entre grandes empresas que passam a exercer monopólio em sua atividade, sem qualquer fiscalização. O que não é exclusivo do setor privado, basta ver o loteamento do país, por exemplo, entre empresas estaduais de água e saneamento, que mantém verdadeiras reservas de mercado que tornam os serviços destas empresas caros e ineficientes.

Voltemos ao outro lado do Atlântico. Tenho acompanhado pelas redes sociais o incansável trabalho das associações de famílias de imigrantes brasileiros na Europa, que apesar das dificuldades não desistem da difusão do português como língua de herança, isto acoplado à divulgação de nossa cultura.

Conversei com a Denise Castro, da Linguarte, de Munique (Alemanha), a respeito dos eventos (seminários, oficinas, encontros) que continuam a todo vapor, apesar do inverno rigoroso na Europa. Segundo Denise, permeiam estes eventos assuntos como o incentivo ao reconhecimento da importância da língua de herança; desconstrução do bilinguismo e multilinguismo, no sentido de esclarecer dúvidas e desvendar tabus, para que as comunidades brasileiras nos diversos países entendam que isto não é confuso nem sacrificante para a criança; informação e dicas sobre práticas de ensino nos diversos contextos fora do Brasil e, por fim, muitos debates sobre a impossibilidade de um material didático fixo, uma vez que cada país tem uma afluência ou linguística diferente, clima, história etc. Ou seja, “cada criança é uma criança e temos que ser múltiplos em sala de aula, pra não virar língua estrangeira. É uma linha de ensino nova, tem muita gente querendo aplicar e ensinar, mas há pouco material a respeito. Estes encontros possibilitam trocas e construção de conhecimento. Reflexão e ajuda mútua”.

Do lado português, é digno de elogio o trabalho do Instituto Camões, de Portugal, responsável pela “política externa” sem fronteiras da língua-mãe. As ações do Instituto Camões são de dar inveja. Denise reconhece o papel do Instituto Camões, inclusive em benefício dos brasileiros no exterior, mas alerta que “não perdemos linguisticamente, perdemos culturalmente. O cenário brasileiro é bem diferente do português. Ao ler literatura portuguesa, nossas crianças tem uma imagem de lar ao cheiro e gosto de Portugal. Fica no imaginário poético. Não é de todo ruim, mas seria bem melhor, para uma criança de origem brasileira, ver símbolos de peculiaridades brasileiras”.

A lição de Portugal faz-me pensar na total falta de interesse – até mesmo de estratégia nacional – por parte dos governos brasileiros frente ao trabalho dessas abnegadas mães (mas também pais) que, mesmo distante da pátria, dedicam parte do seu tempo - e mesmo recursos financeiros próprios – para levar avante a valorização de nossa língua e cultura.

O que vemos por nossas bandas é a desconecção entre ministérios (Relações Exteriores, Educação, Cultura etc.), reforçada pela ausência de um órgão como o Instituto Camões, que pudesse promover a integração de ações nas diversas áreas de governo voltadas ao apoio destas associações de famílias no exterior.

Como bem diz Denise, mais do que apoio moral, o que estas famílias precisam é de apoio efetivo para oferecer cursos profissionalizantes a mães de crianças bilíngues, por exemplo. Ou na forma de envio de livros. “A biblioteca internacional de Munique tem mais obras portuguesas do que brasileiras, acredita? Quem traz livros são os próprios brasileiros, juntam-se e dividem o peso da bagagem.”

É fato que há envolvimento de alguns poucos embaixadores e membros do corpo consular sensíveis à importância de tais iniciativas empreendedoras. Há casos isolados de embaixadas que levam em seus “malotes” livros do MEC para associações de famílias de imigrantes. Ou mesmo que prestigiam eventos realizados por estas entidades, o que envolve, muitas vezes, conseguir uma sala ou auditório ou mesmo algum apoio da prefeitura local.

Recado dado, voltemos ao mundo doméstico. Já se falou muito da esquizofrenia do governo Temer, que completou nove meses. Uma área econômica que começar a colher resultados devido à seriedade e competência de sua equipe contrasta com a área política onde as trapalhadas do governo (ministros despreparados ou mal intencionados) se confundem com lambanças e tentativas descaradas de livrar os políticos da operação Lava Jato (blindagens e anistias).

Enquanto isso, mais de 100 anos depois constatamos que ainda persiste a triste realidade dos tempos das famosas expedições do sanitarista Oswaldo Cruz pelo interior do Brasil. “Ele não olhava só para os operários doentes. Ele via como era a cidade, como as pessoas viviam e que tipo de coisa tornava aquele local insalubre, como matadouros de animais, esgoto, falta de saneamento básico”, disse ao jornal O Estado de S. Paulo (19/02/2017) a historiadora e pesquisadora Ana Luce Girão, da Casa de Oswaldo Cruz, unidade da Fiocruz.

Começo a acreditar que o Brasil não consegue dar o salto definitivo para a companhia dos países desenvolvidos porque a mediocridade dos atores políticos, sejam eles de esquerda, centro ou direita, atrapalha o desempenho da economia, da saúde, da educação, da gestão pública etc. etc.

Neste mundo estreito ou alargado, caminhamos entre fatos e versões. Pós-verdade ou pós-mentira? Eis a questão!

 

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