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Apelidar alguém

22 de Janeiro de 2025, por Regina Coelho

influenciado pelo pai, o menino Dico sempre foi fã de futebol e logo começou a fazer parte dos times de garotos que jogavam bola na rua. Gostava de atuar no gol, por se inspirar no goleiro Bilé, amigo de time de seu pai, que também jogava. Com a dicção ainda se formando e, por isso, sem conseguir pronunciar corretamente o apelido de Bilé, durante os jogos com os colegas de time, falava algo equivalente a “Segura Pilééé!”, quando, entusiasmado, fazia suas próprias defesas. O fato fez com que os companheiros passassem a chamá-lo de Pilé, Pelé, o que não o agradava. E como quase todo bom apelido nessa situação, a alcunha pegou. E como pegou! Com ela e, principalmente, com a genialidade demonstrada mais tarde como jogador profissional (na nomenclatura atual, com a função de meia-atacante), o mineiro criado no interior paulista fez a vida, a fama e se tornou mundialmente conhecido e reconhecido como o Rei de Futebol.

Pelé é o nome à frente do homem Edson Arantes do Nascimento, que costumava se referir a si mesmo na terceira pessoa do singular, em se tratando do atleta. Assim, fazia distinção entre o apelido e seu nome civil, como que sinalizando ser ele alguém dividido em duas pessoas diferentes. Não é exatamente o caso de Xuxa, tão somente registrada como Maria da Graça Meneghel, mas chamada, desde o berço, pelo apelido que lhe atribuiu o irmão mais velho e que contou com a pronta aprovação da mãe.

Pelé e Xuxa, curiosamente, um ex-casal, pela imensa popularidade alcançada no país, foram responsáveis pela replicação espontânea de seus apelidos por aí. A imagem dele, em especial, fez muitos jovens pretos virarem Pelé, pelo menos no apelido, tendo surgido até um Pelé de sucesso no vôlei (Minas Tênis Clube e Seleção Brasileira, em destaque). E o Pelezinho, personagem de histórias em quadrinhos criado (1976) por Maurício de Sousa e baseado na infância do Rei. Já a Rainha dos baixinhos, em seus áureos tempos de reinado, provocou uma onda forte de Xuxas covers, ou seja, de moças que, com o visual idêntico ao dela, é claro, se apresentavam em programas de tevê e em shows por este Brasilzão. E foi por conta do cabelo louro e semelhante ao da apresentadora que o hoje ex-nadador e sempre medalhista olímpico Fernando Scherer, ao ganhar projeção (em 1992) no Troféu Brasil com vitórias importantes, ganhou também o apelido Xuxa.

Considerando a força e a presença dos apelidos na vida de muita gente, fica fácil entender a opção de quem incorporou judicialmente esse outro termo ao seu nome de registro, casos da própria Xuxa e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (antes, sem o Lula), entre outros.

Não se cogita aqui falar sobre o ato de apelidar alguém com termos ofensivos, depreciativos ou caluniosos, o que, para dizer o mínimo, não tem graça alguma. Falemos, portanto, de afetividade e intimidade, condições propícias para nomear e chamar de outras formas pessoas que amamos e/ou que nos são próximas. No ambiente doméstico, por exemplo, é praticamente inevitável o uso de nomes no diminutivo e no aumentativo carinhosos, sobretudo os endereçados às crianças. Outras vezes, palavras pronunciadas pelos pequenos (como no caso do menino Dico) ou inventadas por eles costumam gerar praticamente outros nomes para os que os recebem.

Ainda em casa e no âmbito do trabalho profissional, passamos também quase sempre pelo processo de redução dos nomes de cada um(a) de nós. Assim surgem a Ju, a Lu, a Cris, a Carol, o Alê, o Beto, o Fê, o Xande... Talvez por isso também, venha crescendo nos últimos anos uma tendência interessante entre os pais quanto à escolha do nome de um bebê: a transformação de apelidos afetivos em nomes próprios usados agora oficialmente em registros de nascimento. Alguns deles: Bela (ou Bella), Theo, Nina, Gabi (ou Gábi), Duda. Em outras palavras, se já existe uma preferência (ou grande possibilidade) de uso constante desse tipo de apelido, por que não oficializá-lo logo?

Gosto dos apelidos afetuosos, sabendo que o emprego deles tem hora e lugar adequados.

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