De acordo com a definição da própria Pantone, empresa norte-americana considerada uma autoridade mundial em cores como elementos voltados a todas as etapas do fluxo de trabalho para marcas e fabricantes e que elegeu marsala como a cor do ano em 2015, marsala é “um vinho tinto naturalmente robusto e terroso” com “raízes marrom-avermelhadas que emanam uma sofisticação natural”. Pois é. Desde então, parece estar fora de moda referir-se ao que é cor de vinho, grená ou bordô (esse último termo ligado ao vinho da região francesa de Bordeaux ou Bordéus) usando essas palavras.
Em conversa recente num pequeno grupo feminino da família, constatamos alguns outros anacronismos referentes a cores e tons. Se antes tínhamos o rosa-choque ou maravilha, agora tudo é pink. O lilás virou lavanda. O bege, nude. A mesma coisa se observa com os nomes dados a certas peças do vestuário. Ainda que sejam considerados alguns diferenciais nas roupas ditas antigas, por comparação às dos anos subsequentes, muitas delas continuam marcando presença no nosso cotidiano. De tempos em tempos, de uma estação para outra até, rebatizadas, é lógico. Assim, nesse processo de renovação nominal, entre outros exemplos, collant, miniblusa, calça boca de sino e calça fuseau (leia-se fuzô) são denominações que praticamente caíram em desuso. Não esses trajes, que são mais conhecidos no momento como body, cropped, calça flare e calça legging, respectivamente.
Entrando na loja de uma conhecida aqui na cidade em despretensiosa busca por novidades, ouvi dela, em tom de lamento, que as roupas deste outono/inverno que encontrou para comprar estão muito parecidas com as da mesma temporada do ano passado. E que as pessoas querem é novidade, o que é largamente estimulado pela sociedade de consumo na procura pelo que está na moda, em todos os segmentos do mercado.
Etimologicamente falando, a palavra “moda” remete ao francês mode, que, por sua vez, deriva do latim modus, maneira, medida, modo com que qualquer coisa é feita. Em seu conceito mais amplo, moda também é estilo de vida, comportamento e linguagem. Em suma, nosso jeito de nos posicionar perante o mundo.
Moda é movimento, transformação, como ocorre com as palavras. Há aquelas que perdem a utilidade. “Jorna”, por exemplo, é uma. E corresponde a um dia de trabalho, o salário diário. O fato de nos dias de hoje ser pouco frequente alguém ganhar ao dia, como acontece com os diaristas, é uma das razões de essa palavra não ser usual. “Ceroulas” é outra. Atualmente, que homem usa essa peça íntima cujo nome causa total estranheza aos mais jovens? Com a evolução da língua, o pronome de tratamento “Vossa Mercê” passou por modificações: vossemecê, vosmecê, até chegar a “você”. “Você”, preferencialmente usado pela simplificação ocorrida e mais popular do que o “tu”, seu correspondente.
Moda é invenção, criação e recriação, como também ocorre com as palavras. À Academia Brasileira de Letras, por meio da elaboração e atualização do “Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa” cabe o registro de palavras e expressões que passaram a ter uso corrente no nosso idioma, seja por neologismos (palavras novas) ou empréstimos linguísticos (incorporação de termos de uma língua à outra). Deletar, etarismo, feminicídio, gordofobia, logar (conectar)... se encaixam no primeiro caso. Enquadram-se como estrangeirismos incluídos no Volp, entre outros, botox, crossfit, emoji, home office, podcast. Esse levantamento da ABL é fruto da necessidade de reconhecimento e oficialização do que já vem sendo usado informalmente pelos falantes.
Convém considerar ainda os termos-relâmpagos, aqueles usados como moda momentânea a partir do que existe, mas recriados com novo significado. Um exemplo? A palavra “gatilho”, usada hoje a exaustão também quando se fala de situações que precipitam sentimentos e sensações desagradáveis. São modismos, da mesma forma que as gírias, que são datadas, passageiras.
Modos de vestir e de falar, de fazer e de viver, tudo é moda, dinâmica como a vida.