Voltar a todos os posts

Verdades eternas

25 de Outubro de 2022, por João Bosco Teixeira

O jornal “O Tempo”, do dia 29 de agosto passado, trouxe matéria de José Reis Chaves, que leio frequentemente. O autor tecia considerações à crítica recebida da organização católica Montfort, de São Paulo, no tocante à “suposta irracionalidade das penas eternas que a Igreja Católica professa como dogma de fé”.

Não posso pretender entabular diálogo seja com o colunista de “O Tempo”, seja com a tal organização católica, pois ambos me parecem mais conhecedores que eu. No entanto, embasado em minhas licenciaturas em filosofia e teologia, no mestrado em psicologia e em muito estudo de Sagrada Escritura, não fujo da ocasião de tecer algum comentário sobre a matéria.

Em termos de espiritualidade, sou movido por algumas convicções. Em primeiríssimo lugar, aquela de que a fé cristã é uma experiência de amor, muito mais que aceitar verdades e doutrinas. E não consigo imaginar verdades eternas. Toda verdade é provisória, o que não a impede de ser verdadeira. As verdades são todas gestadas no tempo. Em algum tempo. Em determinado tempo. E a própria história é filha de seu tempo. Não faz mal considerar, além disso, que os dogmas católicos foram, quase todos, impostos pela força. Não só. Foram proclamados por se tratar de doutrina polêmica e para combater heresias. Não são fruto de exigência teológica.

Outra convicção que me move: o único caminho que temos para alcançarmos o divino, para chegarmos a Deus, é o caminho da nossa humanidade. Nela é que nos é dado experimentar o eterno, objeto de esperança, alimentada pela fé. E nossa humanidade acontece e é inerente ao tempo e ao espaço. Os grandes espiritualistas e santos são reconhecidos, em sua grandeza, não porque fugiram de seu tempo, mas pela maneira como viveram plenamente sua humanidade, no tempo. O grande Irineu de Lião, já no segundo século, dizia: “É falso todo Deus cuja glória não seja a vida do homem”. Criamos deuses falsos não tanto porque falseamos Deus, quanto porque falseamos o homem.

Terceira convicção: só conseguimos nos referir a Deus com nossa linguagem humana. E, então, emprestamos a Deus nossas características, nossa maneira de viver, nossas expressões de conhecimento. Por isso, falamos de penas eternas, falamos de purgatório purificador, falamos de pecado e tanta coisa mais que, no Deus anunciado por Jesus, não tem lugar. Deformamos de tal forma a imagem de Deus que Ele deixa de ser o pai da parábola do filho pródigo (Lc 15). Já no IV Concílio de Latrão, de 1215, se dizia que em nossa linguagem sobre Deus, por mais verdadeira que seja, existe sempre mais mentira que verdade (Non tanta similitudo quin maior sit dissimilitudo notanda).

Sou apaixonado pela teologia porque é a única que me liberta. E não a estudo para parecer mais sábio e douto. Não! É pela certeza de que Deus é uma presença real na própria raiz de nosso ser.

Essa, talvez, seja uma verdade eterna.

Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário