Meio Ambiente

De quem é o novo Código Florestal

13 de Junho de 2012, por Instituto Rio Santo Antônio 0

Fernando Chaves


Foi sancionado no último dia 28 o novo Código Florestal, que regulamenta a exploração da terra e dos recursos florestais no país.  Dilma vetou 12 artigos e processou 32 modificações no texto aprovado pelo Congresso. O Governo expediu uma medida provisória (MP), que recompõe o conteúdo dos artigos vetados e modificados. Essas alterações ainda retornam ao Congresso, conforme prevê a Constituição. Assim, a MP ainda pode sofrer alterações.

O Brasil é um dos países com maior disponibilidade de recursos florestais, sendo um dos maiores repositórios de biodiversidade e de água doce do mundo. Em grande medida, são essas riquezas naturais que colocam o país numa posição de relevância em debates internacionais, como no caso das mudanças climáticas ou do uso de energias limpas. Além de garantir alimento e qualidade de vida para gerações futuras, gerir bem as preciosidades naturais do país significa preservar uma espécie de “capital ambiental” da nação, que internacionalmente se reverte em poder geopolítico. Isto é, natureza e soberania no Brasil são questões que devem ser pensadas de maneira integrada.

O Código Florestal define o quanto precisa ser preservado de vegetação nativa em cada propriedade rural (reserva legal) e que tipo de local é considerado área de preservação permanente (APP), como é o caso de margens de rios e nascentes, de topos de morros e de manguezais. Um dos pontos centrais da discussão acerca do novo código era a diminuição das matas ciliares (vegetação das margens dos rios). A proposta aprovada no congresso previa, para os cursos d’água de até 10 metros de largura, a diminuição da faixa mínima de mata ciliar de 30 para 15 metros.  Essa alteração foi vetada, sendo mantido o antigo estatuto de APP, no qual as matas ciliares variam entre 30 e 500 metros, de acordo com a largura do rio. A novidade sancionada em relação à APP é que o pequeno produtor poderá fazer uso sustentável dessas áreas mediante cadastro específico.    

Quanto à reserva legal, a maioria das regras permanecem. O tamanho da reserva é estabelecido de acordo com o bioma em que se localiza a propriedade rural. Com relação à Amazônia, foi aprovada pelo congresso e sancionada pela presidência a possibilidade de diminuição da reserva legal de 80% para 50% da propriedade rural, caso a unidade federativa possua mais de 65% de sua área protegida e/ou terras indígenas em seu território.  No caso de Resende Costa, não há alterações. A reserva legal em nosso bioma (Cerrado/Mata Atlântica) deve representar 20% de cada propriedade.  

Outra questão polêmica dizia respeito a uma possível anistia aos desmatadores, isto é, à extinção da obrigatoriedade de recomposição das áreasde APP em locais com atividade agrícola estabelecida. O texto aprovado no congresso transferia para os estados a definição dos critérios de recomposição vegetal nas grandes propriedades, o que foi visto por ambientalistas como possível anistia. O artigo foi vetado e as regras fixadas nacionalmente, de acordo com o tamanho da propriedade, sendo mais flexível para as menores e mais rígida para as maiores.

O novo Código Florestal com certeza não é o código dos ambientalistas. Ele faz concessões ao agronegócio e à expansão da fronteira agrícola. A possibilidade de alguns estados do bioma amazônico diminuírem o percentual de reserva legal em seus territórios é uma flexibilização que atende a uma parcela dos interesses ruralistas. Por outro lado, não queremos acreditar que o novo Código Florestal seja simplesmente o código do agronegócio. Alguns vetos foram fundamentais para conter o avanço do interesse econômico sobre as florestas, além de refletirem uma parte dos anseios sociais expressos nos movimentos pelo veto presidencial.

O grande desafio do Estado continua: fazer cumprir a legislação. Se cumprido, o novo Código pode ser até mesmo uma referência internacional. Nosso país é o único no mundo a exigir a manutenção de reserva legal em propriedades privadas. Se a lei for cumprida, se o Estado se fizer presente... Aí sim, poderemos dizer que nosso Código Florestal não é o código dos ruralistas ou dos ambientalistas, mas sim o código da sociedade brasileira, democrático e eficiente.

O terceiro setor e as ONGs ambientais

23 de Maio de 2012, por Instituto Rio Santo Antônio 0

Fernando Chaves


As ONGs (organizações não governamentais) têm ocupado um espaço crescente na sociedade brasileira já há cerca de duas décadas.  O terceiro setor, isto é, a sociedade civil organizada, se diferencia em relação ao primeiro setor (estado) e ao segundo setor (mercado) e atua em múltiplos campos: cultura, meio ambiente, defesa de minorias, reforma agrária, combate à pobreza etc. A sigla ONG é uma denominação genérica das entidades do terceiro setor, e abarca todo tipo de associação sem fins lucrativos e com finalidade coletiva. As ONGs atuam nas lacunas deixadas pelo setor público (união, estados, municípios) e pelo setor privado (empresas) e trabalham com a ideia de auxílio na resolução de problemas sociais e na fiscalização dos setores público e empresarial.
 
O avanço das ONGs reflete a debilidade dos nossos sistemas político e econômico, além da complexidade da sociedade em que vivemos. O estado não consegue ser onipresente. Não dá conta de representar a imensa variedade de classes, anseios e minorias. E, em tempos de internet, não pode mais calar os debates e forjar identidades. Por seu turno, a economia de mercado não consegue mais emplacar grandes ilusões. A destruição ambiental que nosso sistema econômico produz é uma das molas propulsoras para a emergência do ambientalismo, um dos campos sociais mais ocupados pelas ONGs.

Recentemente, um escândalo de corrupção envolvendo ONGs conveniadas ao Ministério dos Esportes foi intensamente noticiado pela mídia. O problema é que a cobertura noticiosa tradicional muitas vezes ocorre sem a devida contextualização, gerando interpretações reducionistas e preconceituosas.  Assim, a cobertura do escândalo contribuiu para ofuscar injustamente o papel importante que a maioria das entidades civis realiza no Brasil.

Não se trata de defender romanticamente a epopeia das ONGs. O terceiro setor não emerge para salvar o mundo dos reveses da economia de mercado, ou da ineficiência e corrupção estatais. Ele é fruto de um cenário de demandas sociais e políticas e convive com contradições e distorções próprias. Assim como no mundo político e empresarial existem boas e más condutas, também no terceiro setor existem comportamentos heterogêneos.

Há grande desinformação, descrença, desconfiança e indiferença em relação às ONGs, especialmente as ambientais. O que são elas, afinal de contas? O que podem as ONGs ambientais?  Quais suas limitações, suas potencialidades? Como funcionam? Se não funcionam, por quê? Qual o verdadeiro papel de uma ONG ambiental numa comunidade? Tenho a certeza empírica de que a maioria das pessoas têm dificuldades para responder a essas questões, talvez até para formulá-las. Predominam as opiniões superficiais, muitas vezes injustas e preconceituosas.É comum, por exemplo, grupos sociais enxergarem as ONGs ambientais com desdém, como se elas se dedicassem a questões de menor importância, frente a assuntos como a produção econômica ou a geração de empregos. Muitos não conseguem separar das ONGs a pecha do interesse político. Em alguns casos, cobra-se das entidades civis soluções imediatas para questões em que o próprio poder público esteve omisso por décadas.

 Ademais, ao avaliar o trabalho das ONGs, desconsidera-se frequentemente o baixo índice de participação popular da cultura política brasileira, o que torna a mobilização de militantes um grande desafio para as entidades do terceiro setor. A grande missão das ONGs talvez seja esta: mobilizar uma sociedade historicamente pouco participativa, e retirá-la da postura de eterna pedinte em relação ao poder público.

Para além de suas limitações reais e dos estereótipos a elas atribuídos, as ONGs ambientais se mostram viáveis e necessárias em diversos níveis, como na denúncia e revelação de problemas ambientais, na educação ambiental, no auxílio técnico a populações que lidam com o meio ambiente, na fiscalização da atuação empresarial e estatal, na implementação de projetos ambientais visando à disseminação de atitudes sustentáveis (efeito de exemplo), no apoio e assessoria ao poder público, no estímulo à produção de conhecimento ambiental técnico e acadêmico, na implementação direta de projetos de recuperação ambiental e no resgate de identidades culturais ligadas ao manejo sustentável do ambiente.