Causos & Cousas

Pátria de chuteiras

09 de Julho de 2013, por Rosalvo Pinto 0

De repente, a “pátria de chuteiras” virou a “pátria de protestos” e, quem sabe, essa última se transforme na “pátria de esperanças”.

Acabada a festa e a farra, vamos ao trabalho. Também essa história de manifestações, manifestantes e vândalos todo dia - as palavras mais usadas no país nessas últimas semanas - cansa, ninguém é de ferro. Maracanã lotado (de gente rica, claro...), a pátria calçou as chuteiras de campeã. No dia seguinte, a rotina da vida dura: ônibus entupidos e caros, estradas esburacadas, latrocínios, arrastões, custo de vida alto, corrupção, politicagem, filas nos postos de saúde, escolas decadentes, caminhoneiros barrando estradas. E vêm mais coisas por aí...

Eu havia escrito este texto antes dos protestos de rua que, de repente, tomaram conta do país. Ao escrever sobre a Copa do Mundo e seus problemas, eu concluía que a única solução para resolver nossos inumeráveis problemas seria convocar o povo para as ruas. Basta lembrarmos das “Diretas, já” e do “bota-fora do Collor”. Mas, infelizmente, se o Collor voltou, era mal sinal... E, para minha surpresa, o povo foi para as ruas. E, detalhe importante, a maioria, jovens. Era bom sinal.

O momento nos convida a meditar sobre a famosa expressão criada pelo inesquecível Nelson Rodrigues. Depois de publicar a obra “À sombra das chuteiras imortais”, ele escreveu “A pátria de chuteiras”. Na primeira, ele mostrava como o Brasil conseguiu sair do “complexo de vira-lata” depois de vencer as copas de 58, 62 e 70. Na segunda, ele trata da paixão do Brasil pelo futebol. Mas com as derrotas de 74 e 78, ele, desgostoso, disse que havíamos voltado para o antigo complexo.  

Que me perdoem o Nelson Rodrigues e os meus irmãos brasileiros, mas que negócio é esse de “pátria de chuteiras”? Por que não pátria das mãos, dos braços, das pernas, e, sobretudo do cérebro? Ou esse povo do Brasil só tem pés? As mídias gastam horas e muito dinheiro com o futebol. Jogadores mercenários, ganhando fortunas astronômicas, para alimentar, tal como na história do “pão e do circo”, milhões de brasileiros. É um acinte aos milhões de pobres deste país. O Ronaldinho tem mais horas de TV do que a presidente Dilma! E por que todos os outros esportes não têm vez na mídia e no país?

Mas a pátria de chuteiras me leva a outras considerações. No dia 30.10.2007, numa festa na Suíça, o então presidente Lula se emocionou e chorou de alegria. Eu também chorei aqui no Brasil, mas de espanto e de tristeza. A festa lá acabou terminando em carnaval (aliás, tudo por aqui acaba mesmo em carnaval, ou em pizza...) e eu tive vergonha de ser brasileiro. Um país mais pobre, mas sério, jamais pensaria em copa; mas, se aceitasse, começaria a preparação no dia seguinte. Aqui, passaram dois anos, dedicados à campanha eleitoral de 2010. O resultado está aí: atrasos, orçamentos estourados, o caso escandaloso do Corinthians e, o que é pior, a esperança (prometida) de investimentos pesados na infraestrutura de mobilidade urbana, que vai ficar para outra copa. Nossa juventude percebeu essas coisas e saiu para as ruas.

Essa dinheirama desperdiçada para venerar os cartolas da FIFA e da CBF e os jogadores milionários, bem que poderia ser um bom início para investimentos de impacto na educação, na saúde, na infraestrutura esculhambada do país, na segurança etc., mazelas que nos assolam e são o gargalo que entrava o sonho de termos uma sociedade mais justa e igualitária. E olha que ainda vêm por aí as Olimpíadas...

A verdade é que o brasileiro e seus governantes há décadas perderam (se é que já tiveram...) a capacidade de olhar para frente, para o futuro. O que vamos ganhar pelo fato de sediar uma copa mundial de futebol? Só para provar que somos o país de chuteiras? Não seria muito melhor ostentarmos uma pátria de livros, trocando o domínio dos pés enchuteirados pela supremacia do cérebro inteligente e educado?

Caímos no engodo do país rico, do consumo desenfreado, da 6ª. economia do mundo. A economia (leia-se, o capitalismo) não perdoa. Alguém, algum dia, vai pagar a conta. O triste dessa história é que o pior sobra para os milhões de pobres. Deslumbrados, agimos como aquele pobre que ganhou na loteria e no dia seguinte comeu todo o dinheiro. Ou como nos ensina a sabedoria popular: “quem nunca comeu mel (ou melado), quando come se lambuza”.

Que me desculpem meus leitores, às vezes penso que estou marchando na contramão da história. Só o futuro dirá se tenho ou não razão. Escrevo livremente o que eu penso. Não sou ligado a partidos políticos. Sou apenas um simples cidadão que se esforça para colaborar naquilo que possa fazer pelo país (sou professor voluntário na UFMG) e que sonha em viver numa sociedade igualitária, educada, sadia e feliz.

Resta-nos torcer para que a “pátria de protestos” se transforme na “pátria de esperanças”, de riquezas, não das riquezas materiais, mas a riqueza da igualdade social, da educação, da saúde, da civilidade, da justiça, da tranquilidade, da segurança. Se não conseguirmos essa riqueza, continuaremos sendo apenas a “pátria de chuteiras”.

A cocota e eu

11 de Junho de 2013, por Rosalvo Pinto 0

O título é esse mesmo. E não “Eu e a cocota”. A cocota vem primeiro, pois é a principal personagem desta crônica.  

A propósito, não sabia nada sobre a origem do termo “cocota”. Corri ao “pai dos burros” e levei um susto. O Aurélio não registra “cocota” como sendo aquela ave de porte médio, verde brilhante, bico afiado e perigoso, que costuma falar. Nasci e fui criado sempre ao lado de uma cocota, ouvindo todo mundo dizer: “prrrrr, dá o pé, cocota!”, pois minha mãe sempre gostava de ter uma cocota ou um papagaio. Será que o Aurélio não sabia disso? Recorri à internet e... nada de animal. Aurélio e internet só conhecem uma outra “cocota”!

Segundo o doutor Wikipedia, “Vem do francês “cocotte”, que é uma caçarola de perfil baixo, que acabou sendo sinônimo de jovens francesas em férias no balneário de Saint Tropez, que se exibiam em calças jeans justas coladas ao corpo, com a cintura recortada bem abaixo do convencional, copiada por estilistas de moda, décadas depois, que seria conhecida como ‘calça cocota’”. Ou “calça Saint Tropez”. Isso foi lá pelas décadas de 60 e 70. Corresponderia hoje aos termos gatinha, periguete etc. Meninas e mocinhas bonitinhas, patricinhas, metidinhas e... haja “inhas”.

Corria o ano de 1952. O Góes meu pai era fiscal “pé-de-chinelo” da prefeitura de Resende Costa. Uma merreca de salário, sempre atrasado, caderneta sempre dependurada no “negócio” do Chiquito Vale, casa precisando de reforma urgente, filhos pra criar, uma ladainha de problemas. Resolveu tirar férias-prêmio de seis meses e mudar para São João del-Rei com a família. Com ajuda de lá e de cá conseguiu dois empregos: marceneiro durante o dia no Colégio Santo Antônio e guarda-noturno da fábrica de tecidos São João, na vila Santa Teresinha, durante a noite. Eu estava no quarto ano primário e tive que deixar o Grupo Escolar Assis Resende no meio do ano e terminar o primário no Tomé Portes del-Rei, de São João.

Éramos quatro filhos, eu o mais velho. Para nós, mudar, ainda que para uma casa muito ruim, pequena e de chão batido, era a coisa melhor do mundo. Imagine! Morar em São João del-Rei, uma glória! E lá fomos nós. Numa tarde de julho, o caminhão International KB-7 do Zizi Vale, ao volante o Zé Barbosa e como ajudante o Tio Taca (João de Paiva), saiu roncando lotado pra São João. Mamãe e a Mercês na “boleia” e o resto junto com a desengonçada traquitana na carroceria. Amarrada por cima de tudo, a outra inseparável moradora da casa: uma cocota na gaiola.

Por esse meio tempo eu andava com a ideia de ser padre. Vivia na igreja: o catecismo, coroinha e membro da Cruzada Eucarística. Na vila Santa Terezinha frequentava, nos domingos, o Oratório Festivo dos salesianos. Então fiquei interessado pelo seminário deles. Fim de ano, diploma na mão, já poderia entrar no início do ano seguinte. Tudo acertado, aquela expectativa, surgiu um problemão: e o tal do enxoval?  Uma peleja: um presente daqui, um pedido dali, um negocinho qualquer... e a cocota de estimação, coitada, acabou pagando o pato.

Mandaram-me ao mercadinho da cidade para tentar vendê-la, uns cobrinhos a mais.  E lá fui eu com a cocota, 10 anos, a pé, imaginem, no poleiro! Três horas de esperança e nada. Era longe e, com um trocadinho no bolso, peguei a jardineira do Narciso, dirigida pelo Janjão. Assentei-me, meio envergonhado, com o poleiro no colo. A cocota, que nunca tinha andado de ônibus, assustada, resolveu aprontar: pulou no chão e sumiu debaixo dos bancos. Aí começou um alvoroço entre os passageiros, alguns levando bicadas nas pernas. Mais envergonhado ainda, rastejei-me pelo chão pra lá e pra cá e nada de pegá-la, correndo por entre as pernas do povo. Com muito custo consegui agarrá-la, aos guinchos agudos e estridentes. Me deu vontade de abandonar o enxoval, o seminário e, dali, fugir e sumir pra Resende Costa.

O padre Duílio Brescia, diretor do Oratório, prometeu uma ajuda. Eu olhava com inveja seus ajudantes, seminaristas de batina preta: os clérigos Hamilton Silva (meu conterrâneo, filho do Sô Zé do Ciro), Moisés Marchesi e José Camargos. Esse último era o músico que acompanhava os cantos nas missas tocando um pequeníssimo harmônio. Tão pequeno que, mais tarde no seminário, fiquei sabendo que ele era chamado de “Zequinha”. Padre Duílio me deu uma tesourinha e dois cortes de brim, daqueles mais ordinários, para os dois ternos exigidos pelo enxoval. Meu pai os levou para o Ticureba, um sobrinho dele, alfaiate lá no Tejuco. Claro que o feitio foi de graça. E pela primeira vez na vida vesti uma calça comprida.

Com meu pai, seis meses depois, aconteceu o que se esperava: não aguentou mais o rojão, trabalhar dia e noite. Saía de casa às seis da manhã, voltava às cinco da tarde, jantava e ia fazer ronda na fábrica até às cinco da manhã. Voltamos para Resende Costa. O mesmo caminhão, o mesmo “chofer”, o mesmo ajudante e as mesmas traquitanas. Dessa vez, ainda por cima, sob uma chuvarada de janeiro. Amarrada no alto, triunfante por ter escapado do enxoval, a gloriosa cocota. Prrrrr... dá o pé, cocota! 

Rincha, mula “véia”!

15 de Maio de 2013, por Rosalvo Pinto 0

Volto aos meus tempos de criança e de adolescente. Tempos em que convivi com o antigo trem da Rede Mineira de Viação (RMV), nos trechos que, saindo de São João del-Rei, tinha três diferentes destinos: as “Águas Santas”, Barbacena e o “Sertão”. Tempos em que a gente, até carinhosamente, chamava a RMV de “Ruim, Mas Vai”.

A linha das Águas Santas era curta. Saindo relinchando da bela estação de São João del-Rei, logo a maria-fumaça passava sobre o córrego da Água Limpa em um pontilhão de ferro. O nome “pontilhão” já dava medo. Rolavam histórias de mortes e, por isso, poucos se arriscavam a passar a pé naquela geringonça de ferro. Logo adiante uma primeira parada: a estaçãozinha “Chagas Dória”, no bairro de Matozinhos.

Deixando a estação poucos metros depois, a expectativa da passagem no pontilhão sobre o Rio das Mortes. Para nós meninos aquilo era como se fosse, hoje, atravessar a ponte Rio-Niterói. Quando a maria-fumaça enchia o pulmão, soltava um jato de fumaça branca e arrancava apitando da Chagas Dória, alguns pescadores empoleirados no pontilhão tinham que sair às pressas, às vezes até perdendo um belo mandi no anzol.

E falando em pontilhão, lembro-me, aos 10 anos, do Nico Cassiano nos seus quase 90 anos, que vinha lá da rua dos elegantes bangalôs, atravessava o Matola e me pegava na Vila Santa Terezinha para pescar. Um pedaço de linguiça e uma garrafinha de cachaça no embornal, misturadas com suas chumbadas que pesavam quase meio quilo. Assentado no pontilhão, a cada vez que lançava o anzol com aquela baita chumbada, os pescadores por ali torciam o nariz e resmungavam: “aquele velho só serve para espantar os peixes!”

Passada a maria-fumaça, voltavam os pescadores. Depois vinha a parada da curta viagem: a estação “César de Pina”. Logo depois o sonhado destino: o balneário das Águas Santas.

Para nós resende-costenses a César de Pina tinha um atrativo especial. Muita gente, sobretudo homens, costumavam sair de Resende Costa bem de madrugada e andavam umas três léguas a pé até César de Pina e, daí, acabavam de chegar a São João, na volta do trem.

A outra linha era a de São João a Barbacena, passando por Tiradentes. Na subida para Barbacena a maria-fumaça sofria, bufava. Por vezes era até preciso ir jogando areia nos trilhos. Ruim, mas ia! Gastavam-se seis horas de viagem. De Barbacena podia-se pegar a Estrada de Ferro Central do Brasil e continuar para outros rumos: Itabirito, Ouro Preto, Belo Horizonte e até Rio e São Paulo. A RMV tinha uma bitolinha estreita, 60 cm. Parecia até trenzinho de brinquedo perto das imponentes marias-fumaça da Central. Lá era outra história: bitola larga (1,60 m), tudo grande, dava medo! Até o nome era imponente: as “Ramonas”. O relincho era cavernoso, amedrontador.  Dureza era aguentar a fumaça e a chuva de carvõezinhos que invadiam os carros. Os mais prevenidos usavam um guarda-pó, que chegava em casa sujo e cheio de buraquinhos queimados.

A terceira linha era a do “trem do sertão”. O sertão era o oeste de Minas. Para nós aquele nome soava como um lugar longínquo e misterioso. Era a linha mais distante. Ia até Ribeirão Vermelho (perto de Perdões e de Santo Antônio do Amparo), às margens do Rio Grande. O mais esperado era a travessia do pontilhão sobre o Rio Grande, perto do qual o do Rio das Mortes parecia uma pinguelinha.

Morando em São João del-Rei e tendo parentes e amigos que circulavam pelo trem do sertão, a gente ouvia causos curiosos. O trem saía bem cedo e chegava de volta já noitinha adentro.

Vivendo no seminário dos salesianos, no alto do bairro das Fábricas, a gente tinha umas duas horas de estudo no início da noite. Era um salão enorme, silêncio absoluto e rigoroso. Ai de quem dormisse, mesmo depois de um dia de rezas, estudos, recreios, aulas e trabalhos. De tanto em tanto, a gente levantava os olhos já cansados e olhava, ansiosamente, um relógio grande lá no alto, no qual estava escrito em latim: Afflictis, lentae; celeres gaudentibus horae (as horas são lentas para os aflitos e rápidas para os alegres).

Pois bem, aquele silêncio sepulcral só era quebrado, todas as noites, ali pelas sete e meia, com o apito prolongado da maria-fumaça, voltando do sertão. Esse apito se prolongava ao longo da avenida Leite de Castro. Nem era apito, era um relincho contínuo. Daí o outro apelido da RMV: “Rincha, Mula Véia!”. Diziam que o maquinista abria o apito de longe para avisar à “patroa” que já podia ir preparando sua janta. Passando em frente à sua casa, seu colega de cabine, o “foguista”, jogava na beira dos trilhos uma braçada de tições fumegantes. Prá “espertar” o fogo do feijão...

Saudades dos trens-de-ferro, desativados no Brasil pelo furor da indústria automobilística, pelos homens da “gloriosa revolução de 64”, e esquecidos por todos os homens (e a mulher) que os sucederam. Um país continental, só nos restaram rodovias vergonhosas e assassinas. Pobre Brasil, que ainda sonha em ser um país desenvolvido, rico e justo! Bão mesmo era o trem, sô!

A imprensa em Resende Costa

16 de Abril de 2013, por Rosalvo Pinto 1

A imprensa sempre cumpriu um papel fundamental na vida das sociedades humanas. No passado, sobretudo a partir dos anos 50, os meios de comunicação social, que hoje chamamos “mídia”, tiveram um extraordinário desenvolvimento, graças ao grande avanço das tecnologias eletro-eletrônicas. A imprensa escrita, entretanto, manteve sua importância e continua se expandindo, inclusive em nossa cidade, da qual já se pode falar em uma “história da imprensa resende-costense”.

A comemoração dos 10 anos de vida do Jornal das Lajes nos convida a perscrutar, no nosso passado, as tentativas de se ter um jornal. Foram quatro tentativas no século passado e uma “realidade” neste século.

Parece que não se tem notícia da existência de algum jornal até a década de 1930. Uma primeira tentativa de se criar um jornal em nossa terra terá sido em 1932. Tenho em mãos o primeiro exemplar do “Resende Costa”, já bem desgastado pelo tempo, publicado em 24 de janeiro. Abaixo do título o seu objetivo: “Órgão dedicado aos interesses do Município”. Logo abaixo: “Redator e diretor: Carmo Barbosa”.

O “Resende Costa” tem 4 páginas, em forma de tabloide pequeno. Pela capa e pelo seu conteúdo percebe-se que se trata de um jornal mais ligado à administração pública. A capa traz no centro a foto do Cel. Francisco Mendes de Resende (eleito prefeito um ano antes) e um texto que cobre a capa inteira, nos moldes de um “Editorial”. Os demais artigos dizem respeito aos atos da administração municipal: decretos e balancetes do município. Nele já há uma cobrança ao poder público: a solução de um problema da “Ponte Nova”, entre São Francisco Xavier [atual Cel. Xavier Chaves] e César de Pina (estação ferroviária da RMV). Noticia-se também a troca do forro do Teatro Municipal.

Há uma matéria transcrita do jornal “A Época”, (semanário!) de Entre Rios, dando notícia da construção da estrada ligando Resende Costa a Entre Rios. A justificativa da obra é curiosa: os habitantes de São João del-Rei e redondezas gastam um dia inteiro de viagem a Belo Horizonte, pelo trem da “Oeste”; com a ligação RC/ER, essa viagem passaria para 6 horas, indo de carro até Brumadinho e daí de trem (Central) até BH.  Não se tem notícia da duração desse jornal.

Outra tentativa aconteceu em 1949, agora um tabloide grande: o bi-mensal “O Resende Costa”. Tenho em mãos a edição número 1, de quatro páginas, datado de 6 de janeiro. A página de rosto tem um texto longo, “Apresentação”, em forma de Editorial, e um soneto do Miled Hannas: “Prece”.

Interessante conhecer o box com o ”Expediente”: O Resende Costa – Órgão do povo e pelo povo.  Diretor: Miled Hannas – Redator: José Procópio da Silva – Gerente: Geraldo Sebastião Chaves – Sub-gerente: Adão Pinto Lara – Assinatura anual: CR$ 20,00.

Nesse primeiro número, além dos textos dos editores (exceto o Adão), já entram as “colunas”: literatura (dois textos do Gentil Ursino Vale), agro-pecuária, católica, sociais, artes e diversões (cinema), poesia (além do soneto do Miled, um soneto de Natal do José Procópio), política (um texto do Geraldo Chaves) e um texto interessante, diria filosófico, do Dr. Geraldo Rezende (Geraldo do Lulu). Enfim, muita coisa boa naquele longínquo 1949. Lembro-me de ter visto também o número 2. Não sei até quando circulou o “O Resende Costa”.

Mas o nosso Zé Procópio era um obstinado sonhador com um jornal resende-costense. Assim, ele voltou à carga em 1963, com o “O inconfidente”, que veio a lume em 15 de dezembro de 1963. A primeira edição teve como objetivo comemorar a primeira formatura do antigo Ginásio Nossa Senhora da Penha. Em seu editorial, discorrendo sobre o papel da imprensa e esbanjando seu latim, ele dizia que a imprensa é ut ignis: lumino et aestuo, ou seja, é como o fogo, ilumina, mas queima.

Outra tentativa foi a do “Jornal Novo”, idealizado e dirigido pelo então vereador e presidente da Câmara, Antônio Pedro da Silva Melo (Toninho do Zé Augusto), pequeno tabloide mimeografado, que circulou no final da década de 70, encerrado nos inícios da década de 80. Era um órgão mais a serviço das ações da prefeitura e do partido político do regime militar, o Arena/PDS, à época no poder em Resende Costa.

Depois do “Jornal Novo” e no clima de expectativas do novo século surgiu a ideia de um “novo jornal”, idealizado em 2003 pelo Denilson Daher. O número 1 circulou, com quatro páginas, em abril. Sua primeira equipe: André Oliveira, Cássio Jônatas, padre Claudir Trindade, Ednanda Coelho, Márcia Resende, Paulo Andrade, Rômulo Sousa, Sérgio Ricardo, Tatiane Resende e Wanessa de Paula. Na folha de rosto, além do Editorial, o artigo do Denilson, sob o significativo título de “Liberdade”. Na verdade, um belo manifesto sobre a liberdade, a característica fundamental do jornal e da imprensa em geral. O Jornal das Lajes, sob a égide da liberdade, tem como objetivo “agir como um elo entre a sociedade e os órgãos administradores e lutar pela justiça e pelo progresso de Resende Costa”, diz o fundador, que deixou o JL a partir da 16ª. edição, em junho de 2004. Mas a semente que ele plantou continua crescendo, como se pode ver na tabela abaixo:

 

edição

páginas

tiragem

 

edição

páginas

tiragem

    1ª.

    04

  1.000

 

    9ª.

    12

  2.000

    2ª.

    08

  2.000

 

   26ª.

    12

  3.000

    7ª.

    10

  2.000

 

  117ª.

    16

  4.000

As três Resende

12 de Marco de 2013, por Rosalvo Pinto 0

Uma, a mãe, mora em Portugal e duas de suas filhas, aqui no Brasil. Como mãe, é claro, é bem mais velha do que as suas duas filhas. Das duas do Brasil, uma mora no estado do Rio de Janeiro e outra aqui, em Minas Gerais. Vamos conhecer as três.

A mãe foi muito antiga, uma longa história. Pode-se dizer que desde antes de Cristo ela já morava no norte de Portugal, no vale do Rio Douro. Depois vieram os pré-celtas, os iberos, entre outros. Depois os romanos, conquistando toda a península ibérica. Chegaram ao norte do Rio Douro aí pelo ano de 137 a.C. Os nomes “vila” e “paço” (palácio) foram criação dos romanos. Os povoados mais importantes da época eram São Martinho e “Cárquere”, esta um tipo de capital da região. Com os romanos, chegou à península ibérica o cristianismo. Os bárbaros, suevos e visigodos, vieram ao longo do século quinto. Foram cristianizados aos poucos. Depois vieram os mouros (muçulmanos), por volta dos anos 700 e 800. Conquistaram toda a península e, incrível, por lá ficaram por sete ou oito séculos, quando dela foram expulsos.

O nome da terra-mãe, Resende, apareceu no início do século 11, entre os anos 1000 e 1100. A origem dele é controversa entre os estudiosos. Para uns, o nome viria de um senhor (dos godos), chamado Redisindi; para outros, viria do nome germânico Ranosindus (ou Rausindo e Rausendo) e, ainda, seria derivado de um senhor Rausendo Ermiges. Esse seria o senhor do paço dos Resende e teria sido o povoador daquelas terras.

Bem, chegamos à cidade-mãe de Resende. De lá alguns resendinos foram para o arquipélago dos Açores, estabelecendo-se nas ilhas Santa Maria e São Miguel. No início do século 18, veio para o Brasil o primeiro Rezende, João de Rezende Costa (nascido em 1699), que se fixou na região do atual município de Lagoa Dourada.

O historiador português padre Joaquim Correia Duarte escreveu duas obras, Resende e sua História e Casas e Brasões de Resende. Dois belos e interessantes calhamaços, que nosso colega do JL, José Venâncio de Resende, em viagem a Portugal, trouxe da cidade de Resende e as doou para biblioteca de Resende Costa. Quem folheia os dois livros pensa, ao final: tenho que conhecer esta cidade! Um grande número de “paços” lindos e bem conservados, espalhados pelo “Concelho” (município) de Resende. Aí, quando a gente pensa na av. Gonçalves Pinto, na Fazenda das Éguas, nas ruínas das fazendas da Laje e dos Campos Gerais, na caixa d’água da Copasa e na construção roubada a uma das nossas principais praças, dá vontade de chorar. A Resende-mãe portuguesa tem apenas 13.300 habitantes, pouco mais que sua filha resende-costense (entre 10 e 11 mil). Mas vamos à primeira filha da bela Resende-mãe. 

A filha Resende (RJ), nascida em 1744, é pouco mais velha que a filha Resende de Minas. Esta teria sido por volta de 1750. Era uma região que pertencia à capitania do Rio de Janeiro e era vizinha das províncias de São Paulo e de Minas Gerais. Em 1744  um dos desbravadores do interior do Brasil, o capitão paulista Simão da Cunha Gago, obteve licença para desbravar a região à procura de ouro e pedras preciosas. Ele desceu a serra do Mar com seus companheiros, vindo armar acampamento numa colina que avançava sobre o Rio Paraíba. Os habitantes da região eram os índios Puris (no português, “gente tímida e mansa”). Eram, de fato, índios mansos. Mas começaram a dar trabalho para os invasores.

Ali foi erguido um altar onde foram rezadas as primeiras missas. Mais tarde, o acampamento foi transferido para o outro lado do rio devido aos constantes incômodos provocados pelos índios às roças e às plantações dos colonos. O primeiro nome dado à filha foi de Nossa Senhora da Conceição do Campo Alegre da Paraíba Nova. A filha  cresceu rapidamente. Já em 1756, foi elevada à freguesia e, em 1801, passou a ser a Vila de Resende, em homenagem a José Luís de Castro, o Conde de Resende, à época vice-rei do Brasil. O Conde de Resende comandou, de 1790 (quando substituiu o vice-rei Luís de Vasconcelos e Sousa) a 1792, o processo de julgamento e condenação dos inconfidentes, quando foi enforcado Tiradentes e degredado o grupo de 24 condenados, entre eles os nossos José de Resende Costa. Naquela época a vila já tinha 4.000 habitantes.

A cultura do café fez a vila crescer rapidamente e, em 1848, tornou-se cidade, já com uma população de 19 mil pessoas, sendo cerca de 10 mil livres e o restante escravos.

Hoje, a antiga e pequena filha do Brasil Colônia virou uma grande cidade,  industrializada e rica. E o número de habitantes saltou para 122 mil.

Bem, a terceira irmã, todos nós a conhecemos. E a amamos. Com um amor todo especial, pois somos seus filhos. Ao nascer, foi batizada com o singelo nome de “Arraial da Lage”. Cresceu e se desenvolveu. Anos depois, em 1911/12, ao se casar com os muitos “lagartixas” que tomaram conta das lajes, mudou de nome para homenagear seus heróis inconfidentes da família Resende: Resende Costa.

A exemplo da Resende-mãe, vamos preservar o que resta da nossa Resende-filha!