E.E. Assis Resende – centenária jornada
16 de Julho de 2019, por Regina Coelho 0
adílson Trindade dos Santos, 57, é uma espécie de faz-tudo na E.E. Assis Resende, onde também fez o Ensino Médio. Funcionário dedicado, desde 1999, ele é responsável pelos serviços básicos de manutenção da escola. Cuidados com o conserto de mesas, cadeiras e carteiras; o reparo da pintura, parte elétrica e do encanamento; e o trabalho de alvenaria são algumas de suas atribuições diárias. “Hoje posso dizer que o ‘Assis Resende’ é, sem dúvida, minha segunda casa. Com meu jeitinho tímido procuro conviver bem com todos, mesmo com graus de funções diferentes”, afirma, sem esconder o orgulho que sente de fazer parte do que chama de “grande família que é a E. Assis Resende”.
A ela, Iêda da Silva Melo, 74 anos incompletos, tem seu nome ligado como aluna, professora e diretora. Ainda criança, estudou no “Assis Resende” (Grupo Escolar), curso primário, que corresponde agora às primeiras séries do E. Fundamental. Já adulta, como professora transferida da E.E. Conjurados, retornou ao antigo prédio da Praça Rosa Penido. Um ano depois, em 1991, com a aposentadoria da diretora Eunice Gomes, de quem havia se tornado vice, assumiu a direção da escola.
À sugestão para que destacassem um fato que os tenha marcado no desempenho de suas funções profissionais na Casa, a resposta veio em dose dupla para nossos entrevistados. Adílson lembrou o acidente que provocou a morte do Luís Fernando da Cecília (antiga funcionária da escola), quando o filho dela trabalhava na construção do anexo erguido no espaço conhecido como pátio de baixo. Marcante também para ele é o carinho dos ex-alunos, cada um à sua maneira deixando saudades.
Ao ressaltar que o cargo de diretor era considerado de confiança, definindo-se o nome da pessoa escolhida por indicação política, Iêda mencionou como fato de grande relevância o momento (1991) em que as eleições diretas para a direção das escolas estaduais mineiras passaram a ser realidade. “Foi uma novidade que marcou muito. Gostei, porque ser escolhida pelo voto é um critério justo e dá mais segurança para o diretor”, acrescenta. Um problema muitas vezes enfrentado e revelado por ela nessa condição foi a falta de professores habilitados para certas disciplinas, situação que a obrigava a contratar pessoas sem a devida licenciatura para as aulas oferecidas. Quando nem esses profissionais, geralmente com formação acadêmica desfocada do ensino, se dispunham a lecionar, os alunos ficavam simplesmente sem aulas, que eram repostas depois.
Vivemos hoje outros tempos, certamente marcados por novos enfrentamentos e aquela velha constatação do muito que falta avançar na Educação do Brasil. “Mas não devemos perder a esperança, pois o que sei é que a E. E. Assis Resende tem tido bons resultados, mesmo diante do quadro atual do país”, afirma a ex-diretora, atestando a qualidade do ensino no Assis Resende, não sem antes criticar a maioria dos governantes deixando, durante muitos anos, por irregularidades e desonestidade, a Educação e outros setores muito prejudicados.
Comemorados neste ano, seus 100 anos de criação assinalam bonita e significativa existência na vida da cidade. E aqui neste espaço, o Adílson e a Iêda representam os milhares e milhares de cidadãos ligados à história dessa nossa importante instituição, por onde passaram sucessivas gerações de alunos ao longo desse tempo. Isso explica a relação de afeto cultivada pela maioria das famílias resende-costenses com o G. E. Assis Resende, hoje E. E. Assis Resende.
Como tantas pessoas que, até aqui, marcaram presença nas dependências da E. E. Assis Resende como estudantes, trabalhadores ou mesmo pais, eu também sou uma delas. Atuando no Ensino Médio como professora de Inglês, depois, de Português e Literatura, por felizes 18 anos vivi parte de minha história profissional nessa escola, o que muito me honra.
Neste centenário, quando o presente e o passado se juntam em lembrança e reverência ao que foi construído em favor da Educação na cidade, é preciso preparar o futuro com todos os seus desafios.
Salve, E. E. Assis Resende!
Circuito praças de Resende Costa
18 de Junho de 2019, por Regina Coelho 0
Os espaços públicos abertos refletem a natureza da vida urbana, configurando-se como locais de encontros, interações, conexões sociais e de manifestações coletivas ou individuais. Nesse sentido, nada é mais representativo do que as praças de todas as cidades. Diferentemente das ruas, que são geralmente pontos de passagem, as praças são lugares de permanência e constituem, assim como ocorre com as alamedas e os parques, importantes áreas verdes e de lazer.
Andando por Resende Costa, redescobrimos essas paisagens, por vezes familiares para muitos, talvez mesmo a extensão de tantas casas, levando no nome homenagens e testemunhando o dia a dia em seus domínios. Nosso giro pelo centro da cidade abrange as seguintes praças:
Cel. Sousa Maia- Homenageado: João Evangelista de Sousa Maia, chefe político local com atuação na primeira metade do século XX – Local de grande movimentação diária, é cenário da tradicional Festa de N. S. do Rosário e da feirinha dos sábados. E também abrigo de um majestoso tamboril, árvore nativa do Brasil. Para os íntimos é chamada de Largo do Rosário ou simplesmente Rosário.
Cônego Cardoso- Homenageado: Antônio Cardoso Damasceno, pároco em R.C., sua terra natal (1916 a 1921), idealizador e fundador do Hospital N. S. do Rosário. – Conhecida como Largo da Matriz, no entorno da qual se situam o mesmo hospital, a Casa Paroquial, a antiga residência dos inconfidentes José de Resende Costa (Pai e Filho) e a do Padre Toledo, um cruzeiro ao centro e um antigo pau-brasil.
Dom Lara- Homenageado: José Maria Parreira Lara, sacerdote resende-costense elevado a bispo, tendo exercido seu episcopado nas dioceses de Santos (SP) e Caratinga (MG). – Região em frente ao cemitério de cima.
Dr. Costa Pinto- Homenageado: José Vilela da Costa Pinto, médico, tendo atuado na cidade, onde também foi prefeito, na primeira metade do século passado. – Situada no coração da cidade, no passado, ficou marcada por um assassinato que abalou os resende-costenses, quando em 1928, por desavenças pessoais, um certo cabo Ataliba matou a tiros o Manoel, motorista daquele que hoje dá nome à praça.
Marcos dos Reis- Homenageado: Francisco Marcos dos Reis, vereador da primeira Câmara Municipal do município, tendo atuado por várias outras legislaturas. – Área do Posto de Saúde.
Mendes Resende- Homenageado: Francisco Mendes Resende, presidente da primeira Câmara Municipal, primeiro provedor do Hospital N. S. do Rosário e fundador do G. E. Assis Resende (hoje E. E. Assis Resende). – Localizada atrás da Igreja Matriz.
- S. de Fátima- Homenageada: N. S. de Fátima, cuja imagem está entronizada na gruta de mesmo nome compondo o monumento erguido em 1963 por ocasião das missões efetuadas por padres capuchinhos. – A ex-Praça da Bandeira é conhecida também como as Lajes de Cima ou Mirante das Lajes, com seu famoso Buraco do Inferno, destacando-se nela ainda os prédios da Câmara Municipal e da Biblioteca Municipal Antônio Gonçalves Pinto.
Professora Rosa Soares Penido- Homenageada: Rosa Soares Penido, professora rural no povoado do Curralinho dos Paulas e matriarca da Família Penido. – A então denominada Praça Dois de Junho é o endereço da E. E. Assis Resende. Nos tempos da “graminha”, por óbvia razão, assim era chamada essa pracinha, um campinho era improvisado ali pela meninada da vizinhança para o futebol de todo dia. E na madrugada de Sexta-Feira da Paixão para Sábado de Aleluia, por muitas vezes esse mesmo local foi palco das Chácaras do Judas, um ajuntamento de coisas levadas sorrateiramente dos quintais alheios para a “chácara” representando a herança do traidor, então exposto como boneco à malhação pública.
De um modo geral, nossas praças são pequenas e bem cuidadas. Algumas não têm identificação aparente ou suficiente. Outras poderiam ser mais bem utilizadas pela população. Inseridas suas outras múltiplas funções, todas são um convite ao descanso, à boa prosa e à vida compartilhada além das nossas casas.
Quadrinhos – histórias para contar e encantar
14 de Maio de 2019, por Regina Coelho 1
O tico-Tico, a primeira revista a publicar histórias em quadrinhos no Brasil, surgiu em 1905 e teve fãs famosos. Entre eles, o jurista, político e diplomata brasileiro Ruy Barbosa, a escritora Ruth Rocha e o poeta Carlos Drummond de Andrade, que disse certa vez que muita gente importante leu essa publicação quando criança. E sobre isso brincou: “Se alguns alcançaram importância mas fizeram bobagens, O Tico-Tico não teve culpa. O Dr. Sabe-Tudo e o Vovô (dois personagens do almanaque) ensinavam sempre a maneira correta de viver, de sentar-se à mesa e de servir à pátria. E da remota infância, esse passarinho gentil voa até nós, trazendo no bico o melhor que fomos um dia. Obrigado, amigo!”
Foi ainda nas páginas dessa revista infantil que as tiras estreladas por Mickey começaram a ser publicadas por aqui em 1930. Inicialmente, ele ganhou o nome de Ratinho Curioso, mas logo passou a usar sua denominação original e a aparecer em outras publicações.
Dessa década em diante, com a concorrência norte-americana, nosso O Tico-Tico perdeu força, já que não acompanhava as mudanças praticadas pela Disney, empresa responsável pela publicação ininterrupta de quadrinhos no país. Isso se deu a partir de 1950 com o lançamento da revista O Pato Donald pela Editora Abril, que não mais publica as HQs Disney. Diante desse quadro cada vez mais desfavorável, o “passarinho gentil”, depois de 2097 edições e para decepção e tristeza de várias gerações de brasileiros, deixou definitivamente de circular, tornando-se página virada de uma história que foi referência cultural no país.
Novos tempos vieram representados pelo conjunto de títulos dos gibis lançados pela Disney ao longo dos anos e seu sucesso estrondoso no mercado editorial do Brasil, por isso mesmo mantendo e conquistando milhares de leitores para seus produtos. E na edição de 18/7/1959, nas páginas da Folha da Manhã (atual Folha de S. Paulo), Maurício de Sousa, então repórter policial do jornal, deu vida a Bidu e Franjinha, personagens de uma tirinha histórica. Estava nascendo a Turma da Mônica, projeto bem-sucedido e genuinamente nacional.
Logicamente, não se fala nessas histórias todas sem que haja quem as leia: o(a) leitor(a), na maioria das vezes elevado à categoria de fã, como se viu no início destas linhas. Do Camilo Vale, 62, professor e apresentador da Rádio Inconfidentes, veio o seguinte depoimento:
“Minha vontade de ler revistinhas começou na infância. Já sabendo ler e escrever, fui me encantando pelas revistinhas Disney e as revistas em formato maior de nossos heróis da TV e do cinema: Tarzan, Zorro, Fantasma, Cavaleiro Negro, Roy Rogers e outros. Também lia Bolinha, Luluzinha e a Turma da Mônica. Todos fazem parte da minha infância e até hoje são lembrados com carinho. Neste pequeno texto, estou revivendo a minha paixão pelos quadrinhos.”
Minha sobrinha Lara Pena, 22, advogada recém-formada, também tem uma ligação especial com esse universo:
“Eu cresci tendo os quadrinhos como companhia. Especialmente os da Turma da Mônica, que chegavam toda semana lá em casa por assinatura. Lembro-me da expectativa que isso me causava e o tanto que eu torcia para vir uma revista com mais histórias dos meus personagens favoritos. Lembro-me também de que, às vezes, eu devorava as revistinhas rápido demais e então eu podia ir à banca comprar um volume diferente. Os quadrinhos foram um dos meus primeiros contatos com a leitura, e eu só tenho a agradecer à turma do bairro do Limoeiro por me fazerem apaixonar por ela.”
Ao completar 60 anos, essa turminha de amigos ainda dá as caras, melhor, carinhas, nas telas do cinema. E na literatura, em que Mônica surge como Alice, a protagonista do célebre romance de Lewis Carroll em Turma da Mônica Alice no País das Maravilhas (M. de Sousa e M.L. Guidin). No entanto, conforme garante Sousa, seus personagens brincam com outras linguagens, mas nunca se esquecem de onde vieram, assim não perdendo a própria identidade.
A gente também não se esquece de onde veio: de uma infância povoada pelas fascinantes histórias em quadrinhos.
A fala como marca de identidade
16 de Abril de 2019, por Regina Coelho 0
Em seu texto de apresentação do livro O que é isso, companheiro? (1979), do jornalista Fernando Gabeira, Ziraldo faz uma revelação interessante sobre o autor. “Tão bem ele usava as palavras de sua língua e tanto impressionava seus colegas de jornal (Jornal do Brasil), (...) que foi este detalhe a primeira coisa que o denunciou quando o embaixador dos Estados Unidos foi sequestrado para a libertação dos primeiros prisioneiros da guerrilha urbana brasileira. O bilhete do resgate estava tão bem escrito, tão tecnicamente bem escrito que os colegas de Gabeira – que havia abandonado o emprego de Chefe de Departamento de Pesquisa do jornal para cair na clandestinidade – não tiveram dúvida: Gabeira está nessa! E não deu outra.”, relata Ziraldo.
Assim é. Podemos ser identificados por inúmeras marcas pessoais, entre elas, pelo nosso estilo linguístico, aqui entendido pelo jeito único que cada um tem de falar e escrever. Essa particularidade é principalmente explorada por muitos profissionais da comunicação. Como apresentador do Mesa Redonda, programa de debates da TV Gazeta de São Paulo, Roberto Avallone, que faleceu recentemente, ao fazer uma pergunta, sempre dizia “interrogação” no fim da frase. E se afirmava algo, “exclamação”. Dependendo da empolgação, dizia “vírgula” ou “ponto”. Isso me faz lembrar o hábito de muitos do desenho com os dedos médio e indicador de cada mão imitando as aspas que cercam certas falas.
Não por acaso, no processo de composição de personagens em novelas, programas de humor e propagandas, especialmente, os responsáveis por dar vida a essas criaturas da ficção dão também a elas determinados bordões, as tais frases proferidas exaustivamente para colar na imagem e nas ideias de quem fala. A intenção é essa. E quando um bordão emplaca, ganha a boca do povo, muitas vezes resistindo ao tempo. Prova disso é o “Tô certo ou tô errado?” do inesquecível Sinhozinho Malta (Lima Duarte), em Roque Santeiro (1985), TV Globo, novela de Dias Gomes. Na contextualização da frase, em tom intimidatório, querendo ter sempre razão, a personagem balança pulseira e relógio de ouro no braço, chacoalhando-os como uma cascavel. Mais recente (2004-2015) é o “Isso não te pertence mais”, de Fabiana Karla, intérprete de Dona Gislaine, uma divertida personal trainer de novos-pobres no Zorra Total, TV Globo, hoje reformulado no título (apenas Zorra) e na proposta (mais cult e foco no cotidiano). Para completar a trinca de bordões populares, não poderia faltar o “Não é assim uma Brastemp” (1991), texto usado ainda hoje como justificativa na comparação de algum produto tido como inferior porque não é uma “Brastemp”, ou seja, um artigo com a qualidade dessa marca, subentendida como superior em relação às demais.
Com olhos e ouvidos atentos e treinados pela profissão de muitos anos, vivo interessada nas palavras, em especial, nas expressões da vida real compartilhadas por tanta gente, ao mesmo tempo personalizadas em vocabulário próprio adotado naturalmente. Dessa forma, nós nos pegamos falando como nossos pais falariam e absorvemos o que vem da rua, da tevê, das redes sociais, dos livros... Daí surge o estilo linguístico de cada um. Com bordões, inclusive, que isso não é só coisa de artista.
A gravação de uma voz anunciando pelas ruas de Resende Costa o “abacaxi doce, doce como mel” e o grito de “ó gás ás ás!!!” ecoando pelo centro da vizinha São João são boas formas de identificação desses produtos e de seus respectivos vendedores. Mas marcante mesmo foi ouvir por muito tempo a voz sorridente de uma certa senhora quando chegava em nossa casa carregando um balaio com sua produção artesanal de sabão de bola, que vendia para as freguesas, minha mãe, uma delas. Feito com cinza curtida (cujo líquido virava a dicoada) e sebo de vaca cozido, cada um deles vinha embrulhado na palha. Da escada mesmo, ao anunciar sua presença, D. Maria da Luz Vieira dizia: “D. Olga, ó o sabão, bem!”, todas as vezes exatamente assim, cativante e estilosa.
Uma questão de respeito
12 de Marco de 2019, por Regina Coelho 0
uma peça publicitária veiculada no jornal O TEMPO (8/3/2018) traz na capa o rosto de uma mulher e esta frase: “A rotina de muitas mulheres tem uma face que você não vê.” E a seguinte sugestão a quem está lendo o artigo: “Coloque esta página contra a luz e conheça essa realidade.” Como efeito, a imagem da moça aparece com vários hematomas, ao lado dos quais aparece, no verso, este trecho:
“Ele achou minha saia muito curta.”
“Me atrasei 15 minutos pra chegar em casa depois do trabalho.”
“O almoço não ficou pronto na hora em que ele mandou.”
“Eu não queria sexo naquela noite.”
Ao pé da página, o arremate: “A cada segundo, uma mulher sofre algum tipo de violência no Brasil. Denunciar é mais rápido que ler esse anúncio. Ligue 180.”
Nas falas acima, as partes em negrito destacam algumas possíveis “motivações” para a agressão física. Inaceitáveis todas elas, inclusive as que não foram citadas, porque nada pode justificar tamanha covardia. Passado um ano da publicação dessa matéria, a situação de violência contra nós no país não retrocedeu. Pelo contrário. Casos envolvendo esse tipo de crime se multiplicam numa sucessão impressionante de novas e parecidas ocorrências.
Atente-se ainda para o destaque das frases finais no mesmo texto. Denunciar quem agride pode significar fazer cessar a agressão e não ser conivente com o delito, podendo representar em situações de maior gravidade a diferença entre a vida e a morte da vítima. Segundo o congolês Denis Mukwege, um dos ganhadores do Nobel da Paz de 2018 (juntamente com a iraquiana Nadia Murad, ex-escrava do Estado Islâmico), em seu discurso de premiação, “não são apenas os autores da violência que são responsáveis por seus crimes, mas também os que escolheram fechar os olhos (para isso)”. Nesse sentido, desconsidera-se a aplicação daquele velho ditado popular, segundo o qual “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher.”
Como se pode deduzir das palavras de Mukwege, não há distinção geográfica em relação à violência. Muito menos contra as mulheres. Tampouco há distinção social nisso. No Brasil, entre tantos fatos dessa natureza, chamou especialmente a atenção em 2017 o caso de um ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, acusado de agredir a mulher durante uma briga do casal, afirmou ter ela se machucado ao escorregar no enxaguante bucal Listerine.
No enfrentamento desse problema, a legislação brasileira conta, desde 2006, com o suporte da Lei 11.340 (Lei Maria da Penha). De 2015 é a Lei do Feminicídio, aplicada a assassinatos em que a mulher é morta por questões de gênero. Infelizmente, menos de 10% dos municípios brasileiros possuem delegacias especializadas de atendimento à mulher. E é claro! É preciso que haja punição contra pessoas agressoras, mas também é importante aumentar a rede de proteção às pessoas agredidas. E principalmente, é necessário mudar a cultura de quem agride, na maioria das vezes, o homem.
E por que ele agride? E por que ele mata? O inconformismo com o fim do relacionamento é a causa imediata mais comum, fruto de sua percepção machista ao tratar a figura feminina como objeto de sua posse, consequentemente sob seu domínio, numa relação na qual a mulher é acintosa ou subliminarmente desrespeitada em sua integridade física, moral e emocional.
Neste março simbólico definitivamente dedicado às mulheres, que bom seria não precisar haver o nosso dia 8! Que bom seria não precisar falar de assunto tão triste! E de outros ligados à realidade feminina como, por exemplo, a desigualdade salarial ainda existente em desfavor das profissionais inseridas no mercado formal de trabalho. Mas lembrando Rita Lee, em Cor de rosa choque (1982/ Lee e Roberto de Carvalho), o “sexo frágil não foge à luta”. E sexo frágil é apenas uma força de expressão. E cor de rosa também, apenas uma mera convenção ligada à condição feminina. O importante mesmo é o respeito incondicional a todas as mulheres. Simples assim!