Acima de tudo, mulheres
17 de Marco de 2021, por Regina Coelho 0
uma cena familiar contada em casa e vivida por minha mãe me vem à lembrança agora. Início dos anos 1960. Numa das festas de escola, chamadas de auditório, daquela vez em comemoração ao Dia das Mães no então Grupo Escolar Assis Resende, dona Olga foi contemplada pelo aluno Amadeu (seu filho) com um “presente” simplesmente impensável para uma mulher nos dias de hoje, mas que a “rainha” do nosso lar adorou. Tratava-se de um bonito liquidificador. O que naquela época foi recebido naturalmente como um agrado certamente é visto já há algum tempo como um símbolo do trabalho doméstico ainda atribuído primeiramente à parte feminina da família e realizado sem o reconhecimento do valor que deveria ter em grande parte das casas e, consequentemente, na sociedade.
Um texto que circula na internet e é atribuído a alguém de nome Ryshell Castleberry (ou Castleburry) atenta para essa questão. Considera-se nele uma conversa fictícia entre um marido (M) e um psicólogo (P). Intitulado A minha mulher não trabalha, a minha mulher não trabalha!, o diálogo tem a seguinte introdução:
P: O que faz para ganhar a vida, Senhor Rogers?
M: Trabalho como contabilista num banco.
P: E a sua esposa?
M: Não trabalha. Ela é dona de casa.
P: Quem prepara o pequeno almoço para a sua família?
M: A minha mulher, porque ela não trabalha.
P: A que horas se levanta a sua mulher?
M: Levanta-se cedo para organizar tudo. Prepara o almoço para as crianças, assegura-se de que estão bem-vestidas e penteadas, que tomaram o pequeno almoço, que lavaram os dentes e que estão levando tudo para a escola. Cuida do bebê. Muda-lhe a fralda e a roupa. E também o amamenta.
P: E como vão os seus filhos para a escola?
M: Leva-os a minha mulher, porque ela não trabalha.
(...)
E por aí vai essa prosa, que não tem nada de ficção no conteúdo que traz. Infelizmente, a desvalorização dos inúmeros afazeres executados pelas donas de casa ainda é uma realidade, um problema cultural de arraigadas estruturas desfavoráveis à figura feminina, em tempos mais remotos, vista apenas como uma criatura de grande serventia domiciliar. Entendia-se socialmente que esse era o seu papel no mundo. E mesmo depois que ela conquistou a duras penas o direito de trabalhar fora, as obrigações domésticas continuaram sob sua responsabilidade, caracterizando uma dupla jornada de trabalho. Além de tudo, situação inaceitável também é que, ao exerceratividade profissional além dos limites do lar, seja desrespeitada, explorada e discriminada pela sua condição de mulher.
Levando em consideração essa conjuntura de mudanças ligadas às atribuições femininas, é compreensível que tenha causado alvoroço e dividido opiniões no país matéria publicada pela Veja em abril de 2016 sobre o perfil de Marcela Temer (mulher de Michel Temer, então vice-presidente brasileiro). Ao retratar Marcela, entre a acusação de uns de ter usado um viés machista e a defesa de outros de não ter pregado um modelo a ser seguido, de fato, a revista tornou mesmo inesquecível oBela, recatada e do lar, título da reportagem aqui mencionada. É evidente que não há problema algum alguém ser caracterizado assim desde que isso não seja uma obrigação ou um ideal a ser alcançado. Longe disso! Nessa trinca adjetiva, a expressão “do lar”, usada principalmente em documentos que precisam de qualificação completa da pessoa mencionada, apresenta um certo sentido depreciativo ao restringir a atuação feminina no âmbito fechado da família. “Fulana de tal, brasileira, casada (ou solteira ou...), do lar...
O.k. pela opção de qualquer pessoa em viver uma vida tradicional. Tudo contra a ideia de que apenas esse tipo de mulher tem valor. Liberdade para ser dona de casa, sem precisar de ouvir o injusto comentário de ter uma “vida mansa”. Mas abaixo a desimportância e a invisibilidade que essa função ainda tem entre nós. Nada de retrocessos na luta das mulheres pela igualdade de direitos.
Este Contemplando... é dedicado a todas as mulheres. E para nós cito Clarice: “Todas as manhãs ela deixa os sonhos na cama, acorda e põe a roupa de viver”.
“Esplêndida aventura”
18 de Fevereiro de 2021, por Regina Coelho 0
“dicionário, para mim, nunca foi apenas obra de consulta. Costumo ler e estudar dicionários. Como escritor, sou obrigado a jogar com palavras. Logo, preciso conhecer o seu valor exato.”
Essa foi a resposta do escritor Graciliano Ramos (1892-1953) a uma anterior observação do jornalista Homero Senna sobre o assunto em entrevista dele ao autor de Vidas secas (a última do “Velho Graça”), preciosidade publicada originalmente em 1948.
Ainda que desprovida dos predicados do entrevistado em questão, também costumo ler e estudar dicionários. E mais. Não abro mão de ter meus leais companheiros de papel por perto. Não desconsidero as versões online. Acontece, porém, que me acostumei e me afeiçoei aos calhamaços que carrego e manuseio com prazer. Uma paixão, é verdade. Como professora, dos tempos em sala de aula, ao ensinar e incentivar o uso deles aos alunos mais novos, gostava de rebater o apelido que têm de “o pai dos burros” e preferia chamá-los de “o pai dos inteligentes”, os que vão em busca do conhecimento.
É fato que a origem exata desse epíteto não se tem. Segundo Ana Salgado, lexicógrafa portuguesa, “poderíamos, é certo, estabelecer uma relação entre dicionário, obra de saber, com o não saber de quem o vai consultar. Mas não. A expressão deve-se ao facto de o pai de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (autor do Dicionário Aurélio) fabricar carroças puxadas por burros. Essas ditas carroças eram muito cobiçadas pelos passageiros que diziam que não tinham palavras para elogiar o trabalho de seu pai. Assim, Aurélio (ainda menino) decidiu fazer um sumário dos termos usados para os elogios, nascendo o seu primeiro dicionário: o pai dos burros! Lindo, não?”
Indo muito além das indispensáveis definições dos verbetes em todas as suas acepções, esse importante instrumento de pesquisa fornece informações sobre sinônimos, antônimos, ortografia, pronúncia, classe gramatical, etimologia (origem) das palavras, entre outras, abrangendo um campo amplo de conhecimentos lexicográficos. E praticamente todas as áreas do conhecimento humano, daí envolver em sua criação o trabalho coletivo e especializado como suporte técnico ao dicionarista. Fazer um dicionário, sabe-se, é entregar-se a um projeto grandioso, exaustivo, de intermináveis anos e até sacrifícios à saúde de quem a ele se dedica.
Algumas curiosidades sobre essas monumentais fontes de estudo merecem aqui um registro em forma de palavras. A primeira é “saudade”, que não tem tradução em outras línguas. A segunda é, preparem-se!, “pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico”, a maior palavra do português, com 46 letras, registrada no Dicionário Houaiss da língua portuguesa em 2001. Significado: relativo a, próprio de doença pulmonar causada pela aspiração de cinzas vulcânicas. A terceira palavra é “alfabetizar”. v.t.d. 1. Ensinar a ler: “Capitão Josué contratou uma professora, em Santana, para alfabetizar os filhos.” (Gentil Ursino Vale, Confidências do Agreste, p.11) – Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
Além de popularizar o acesso ao dicionário, Aurélio Buarque também inovou ao trazer citações de outros autores ao lado da definição das palavras. É o que vê acima ao usar a frase de um livro do escritor resende-costense Gentil Vale para contextualizar o verbete “alfabetizar” (em sua primeira acepção), um reconhecimento público de peso à obra do nosso conterrâneo.
“Fazer dicionários é como caçar borboletas. As palavras voam, é preciso caçá-las”, dessa forma definia seu ofício Aurélio, cujo nome virou nome de dicionário, lançado em 1975 e o maior fenômeno do mercado editorial brasileiro. E termino com Monteiro Lobato (1882-1948). Lembrado pelo jornalista citado no início desta matéria (ao entrevistar Graciliano) como também um leitor de dicionários, Lobato, referindo-se ao Dicionário Aulete (publicado em Lisboa, 1881) fala com entusiasmo em carta ao amigo Godofredo Rangel (escritor) da “aventura esplêndida” que estava sendo para ele o passeio pelo “oceano das palavras”.
Desejos de paz
20 de Janeiro de 2021, por Regina Coelho 0
“A paz/Invadiu o meu coração/De repente, me encheu de paz/Como se o vento de um tufão/Arrancasse meus pés do chão/Onde eu já não me enterro mais.
A paz/Fez o mar da revolução/Invadir meu destino a paz/Como aquela grande explosão/Uma bomba sobre o Japão/Fez nascer o Japão na paz.
Eu pensei em mim/Eu pensei em ti/Eu chorei por nós/Que contradição/Só a guerra faz/Nosso amor em paz.
Eu vim/Vim parar na beira do cais/Onde a estrada chegou ao fim/Onde o fim da tarde é lilás/Onde o mar arrebenta em mim/O lamento de tantos ais.”
Começo este 2021 com A paz (1986), bela música de Gilberto Gil e João Donato. A letra, segundo Gil, foi inspirada no nome do célebre romance histórico Guerra e Paz, de Tolstói, escritor russo, e baseada na oposição que o título sugere. Para o sujeito poético dos versos acima o mundo contemporâneo busca a paz, paradoxalmente, através da guerra. A rigor, no entanto, é sabido que a ausência de guerra nem sempre significa que estamos vivendo num ambiente de paz. Historicamente consideradas, situações em que essa realidade se apresentou não faltaram ao longo da trajetória da humanidade. A título de ilustração, tomem-se dois momentos em que se viveu um armistício.
A Pax Romana (Paz Romana), um conjunto de medidas aplicadas em todo Império Romano, ficou conhecida como uma época marcada por uma aparente paz e prosperidade encerrando o período da república romana em 27 a.C. num processo de transição com vistas a rever a estabilidade do Império e garantir sua integridade territorial, se necessário, por coação. Já no século XX, após a Segunda Guerra Mundial (a partir de 1945), houve uma divisão político-ideológica envolvendo os Estados Unidos e a antiga União Soviética. Nessa disputa, representada pelo capitalismo americano e o socialismo soviético, a que se deu o nome de Guerra Fria, não houve conflitos diretos entre os EUA e a URSS (uma potência mundial até então, hoje dissolvida com essa configuração única), mas sim um duradouro estado de tensão entre ambos na vigência desse período.
É possível e necessário compreender que os arranjos aos quais se dão nomes como acordos, convenções ou tratados de paz sejam costurados e assinados, no entanto e verdadeiramente, costumam gerar uma paz imposta pela caneta, pela força dos mais fortes. Não é paz. Num outro sentido, dessa vez dentro do contexto social brasileiro e com o mesmo entendimento sobre essa questão, podem ser analisados os versos da ainda atual letra de Marcelo Yuka (1965-2019) para o sucesso de Minha alma (A paz que eu não quero), de 1999, do grupo O Rappa, que teve Yuka também como seu integrante. Vejamos: “A minha alma está armada/E apontada para a cara/Do sossego/Pois Paz sem voz/Paz sem voz/Não é paz. É medo...” O termo “sossego” aqui é o silêncio, atitude passiva, socialmente aceitável. O próprio título da música faz referência a essa ilusão de um sossego que não se pode querer porque é acomodação diante das injustiças.
Do poema Maísa (Bandeira) me vem agora uma bonita e sugestiva descrição dos olhos da inesquecível cantora brasileira, cujo olhar tinha uma “expressão de amargura”: “Os olhos de Maísa são dois não sei quê dois não sei como diga dois Oceanos não Pacíficos”. Disse tudo o poeta. Os olhos grandes e expressivos de Maísa espelhavam sua vida – intensa e atormentada em comparação inversa às águas tranquilas do Oceano Pacífico.
No dia a dia das tribulações de toda ordem, estamos sempre pedindo (Me deixe em paz!) ou desejando (Fique em paz!) a alguém simplesmente o que de melhor pode haver, pois essa sensação de perfeito bem-estar inclui tudo aquilo de que precisamos para nos sentir felizes ou pelo menos em equilíbrio, o que não é pouca coisa. É fato que, diante dos sobressaltos por que passamos em razão principalmente de um grande e atual inimigo comum a todos, paz é tudo o que não estamos tendo ainda hoje. Mas recomecemos assim mesmo por acreditar, sem a utopia dos ingênuos, na possibilidade de viver dias mais tranquilos e desconceituar como uma atitude meramente contemplativa a paz, que é uma conquista, nosso bem talvez maior.
Nossa essência mineira
13 de Dezembro de 2020, por Regina Coelho 0
o desmembramento da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro em Capitania de São Paulo e Capitania de Minas Gerais, decisão do Conselho Ultramarino e determinação do Alvará Régio de 2 de dezembro de 1720, de D. João V, rei de Portugal, assinala o início da existência administrativa do território mineiro. Definitivamente já lembrado por uma pandemia que mudou o rumo e o ritmo de nossa caminhada, este tricentésimo ano de criação da Capitania de Minas bem que merecia um destaque maior nas mídias, compreensivelmente dominadas por questões mais urgentes. Mas essa marca não pode ser esquecida por tudo o que representa para nós, os nascidos nestas Minas Gerais e parte dessa tricentenária história. Muito mais do que simplesmente não esquecer essa data, é oportuno considerar o que ela sugere como modo de entender quem somos na condição de mineiros e como Minas existe dentro de nós.
Para começo de definição, somos quase todos bairristas, da mesma forma que assim também deve se definir a maioria dos não mineiros em relação a seus respectivos lugares de origem. Esse termo costuma vir carregado de uma conotação negativa, pois a ele está vinculada uma visão estreita de mundo que menospreza tudo aquilo que é de fora, ao mesmo tempo expressa em adoração exagerada pela terra natal. Considera-se aqui o bom bairrismo, uma atitude positiva de amor e orgulho por Minas, que são muitas, já dizia o mineiro Guimarães Rosa.Mas mesmo assim nossa identidade mineira é única, uma questão de mineiridade. Aproprio-me da opinião do também mineiro Fernando Sabino quando disse que tinha chegado à conclusão de que: “se existe uma coisa chamada ‘mineiridade’, consiste em não tocar nunca mais nesse assunto. Isso tem que ser mineiro: não tocar nesse assunto”. Mineiro é assim, nós nos entendemos.
Na estreia do programa Conversa com Bial, em maio de 2017, a ministra do STF Cármen Lúcia roubou a cena ao ser entrevistada pelo jornalista. Ao falar sobre Minas e os mineiros, monopolizou a conversa com uma prosa divertida e inteligente. A certa altura da entrevista, ao ser indagada se a Carminha era a queridinha do pai (Florival Rocha), mineiramente respondeu: “Também se fosse, eu não falaria”. E Bial não resiste: “Eh mineirice!” E ela: “Tô aprendendo porque na verdade, Pedro, eu queria ser mineira, mas eu sou geraiseira. E você sabe que são duas coisas completamente diferentes. O mineiro toma a banana do macaco, deixa o macaco satisfeito, agradecido e devendo favor, com uma facilidade impressionante. O geraiseiro briga com o macaco quando o macaco pega a banana dele. O Gerais é o descampado, é o sertão. Minas é das sombras, das minas, isso, claro, sem nenhum fatalismo geopolítico. Mas é claro que isso orientou (os mineiros)”. Mais adiante, continua: “E o mineiro tem uma coisa maravilhosa. Ele fala assim: ‘Passa lá em casa.’ ‘Passo lá mais tarde.’ Quem convida não deseja, quem aceita não acredita. Não tem erro, esse encontro não acontece e ninguém fica com raiva”. E prossegue: “A boba aqui faz isso. Convida só quem gosta. E aí fica lá esperando com seu bolinho. A pessoa não aparece e eu fico de mal porque não apareceu, ué. Porque me deu o cano.” Bial comenta que adora a expressão mineira “fala mais do que pobre na chuva”. E a ministra afirma que tem uma melhor: “como diz o outro”. Ninguém sabe quem é o outro, nunca dá processo porque não foi você quem disse, quem disse foi o outro, agora, ninguém sabe quem é o outro. É uma beleza. Eu adoro.”
Também adoro! E sem “inventar moda”, recorro a Drummond (“espírito mineiro, circunspecto talvez”) em sua melhor tradução sobre nossa essência mineira.
A palavra Minas
Ninguém sabe Minas (...)
Só os mineiros sabem.
E não dizem nem a si mesmos
o irrevelável segredo
chamado Minas.
Na reta final deste 2020 de difícil travessia, desejo um Natal possível a todos. Com a celebração que o bom senso nos recomenda e algumas doses de energia extra para resistir a tudo isso que está aí.
Política
18 de Novembro de 2020, por Regina Coelho 0
durante a implementação do Plano Real, o economista Edmar Bacha, que fazia parte da equipe de FHC, então ministro da Fazenda, ia diariamente ao Congresso convencer os parlamentares de que o novo programa teria sucesso. Essa informação consta da entrevista dele à Veja (Páginas Amarelas – 7/10/2020). À pergunta de que lições teria tirado do relacionamento que manteve com os congressistas naquela época, foi direto ao dizer:
“Guardei algumas frases que os políticos me diziam. Um dizia: ‘Ô, Bacha, você é Ph.D e tudo mais, mas não vai achando que vai enganar alguém, não. Aqui, o mais bobo foi eleito’. Um outro virava e falava: ‘A gente gosta de verba, mas o que a gente quer mesmo é palanque e prestígio’. E um terceiro disparava: ‘Em negociação política, o relógio zera todo dia, nunca dê hoje para pegar amanhã’.”
Também guardei essas frases sentindo e compartilhando com o entrevistado tal desconforto em relação ao funcionamento dessa engrenagem política de bastidores, mesmo não havendo nisso novidade alguma. Ocorre que estamos em época de eleições municipais pelo país. Fala-se muito nas candidaturas ligadas ao Poder Executivo, talvez pelo número mais reduzido de candidatos e/ou pelo destaque dado a alguém a ser eleito para ocupar uma cadeira única em qualquer uma das esferas desse poder. No entanto, é no Legislativo que tudo começa, basicamente com a criação das leis e a fiscalização ao Executivo.
E candidato a vereador é o que não falta, em Resende Costa também. Em ano de pandemia, a campanha política é atípica, mas a disputa pelas 9 vagas do nosso Legislativo é a de sempre, envolvendo 72 postulantes. Uma breve análise sobre a relação de nomes dos candidatos e seus respectivos partidos revela que o número de candidaturas femininas no município apenas atinge o percentual de 30% a ser cumprido por partido em conformidade com a atual legislação eleitoral. Esse quadro local reflete uma tendência geral, ainda sem apresentar aumento expressivo no número de mulheres candidatas. “Mas podemos perceber uma mudança qualitativa de ter candidaturas reais, com condições materiais, por conta da cota financeira”, (vinda dos Fundos Partidário e Eleitoral e repassada pelos partidos a suas candidatas), avalia Polianna Santos, advogada, professora da PUC-Minas e diretora-presidente da Associação Visibilidade Feminina. “Existe uma questão cultural de achar que lugar da mulher é dentro de casa, e não ocupando espaço de poder na política. Então ela é cantada, menosprezada, objeto de chacota. Quando é eleita, falam de sua roupa, do seu corpo”, diz ela. O que não acontece com os homens.
Eis aí mais uma desigualdade de gênero a ser combatida. A reserva de cotas (numérica e passo adiante agora, financeira) se propõe a isso como começo para candidaturas viáveis e não de fachada ou “laranjas”, artifício este que desacredita a luta e a competência das mulheres também no campo político. No corpo a corpo eleitoral deste 2020, aqui entendido como mera figura de retórica devido ao recomendado distanciamento social, que as candidatas de verdade (e candidatos idem) se apresentem para o bom jogo político fazendo valer suas ideias.
Com mulheres candidatas somente à Câmara na cidade, mesmo assim em número menor, é oportuno lembrar que o vereador é a figura mais próxima do cidadão, condição que o habilita a conhecer melhor a sociedade e a representá-la em suas demandas. No entanto, é bom também desconfiar de quem promete o que não pode cumprir, seja em campanha ou já eleito (haverá uma outra eleição e aí...).
Em retomada à resposta de Bacha, não obstante o decurso de quase 27 anos em que teriam sido proferidas as falas ali contidas e atribuídas a membros do Legislativo Federal da época, elas soam ainda hoje e soam mal porque configuram práticas estranhas, para dizer o mínimo, e reincidentes ao longo do tempo. Nada que possa servir de exemplo positivo aos que anseiam por ingressar na política com propostas voltadas para a busca do bem comum, sem tamanhas espertezas, certas vaidades tolas e o famoso toma lá dá cá, entre outros desvios.