Abrindo novos caminhos

Rota Lisboa (2/2021): Pandemia, máscaras, armas e vacinas

15 de Fevereiro de 2021, por José Venâncio de Resende 0

Carnaval ou coronavírus? (Foto: revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios)

Este ano, as máscaras carnavalescas foram substituídas por máscaras anti-coronavírus. Mas, se não há blocos nem escolas de samba, as aglomerações continuam principalmente em praias, bares clandestinos e sítios. E o Brasil continua em posição desconfortável (9,8 milhões de casos) no ranking mundial da pandemia, que soma o recorde de quase 300 mil novos casos a cada dia.

Por aqui, chega a notícia de que o Brasil alcançou a maior média de mortes (1.105) por semana, desde o início da pandemia. Enquanto isso, o presidente Bolsonaro comemora os decretos que facilitam a compra de armas por cidadãos nacionais. A arma da vacinação continua chegando a estados e municípios em ritmo lento, por falta de vacinas. E pelo visto, só depois do carnaval que não houve, será aprovado o novo auxílio emergencial, que deverá ficar em 250 reais por mês em três parcelas – a partir de junho, só Deus sabe.

Europa

Na Europa, os países continuam em confinamento e com restrições nas fronteiras para conter a terceira onda da pandemia, e a vacinação continua a conta-gotas devido à oferta insuficiente dos imunizantes. A região aspira tornar-se o primeiro continente em produção de vacinas em 18 meses, mas por enquanto tem de se contentar com as três vacinas aprovadas (mais duas nas próximas semanas) e com o reforço das fábricas na Europa e na Suíça, segundo o comissário europeu Thierry Breton.

Portugal vive a pior fase da pandemia, mas começa a mostrar sinais de alívio -  depois do pico de 12.778 casos na média em final de janeiro, caiu para a média de 3.636 casos em 12 de fevereiro; o número de mortes que estava entre 200 e 300 no seu pior momento caiu para menos de 200 embora continue elevado; e os cuidados intensivos nos hospitais permanecem sobrecarregados, sendo os últimos indicadores a baixarem.

Embora em curva descendente, Portugal ainda continua no topo pelos piores motivos: 1.190 casos por 100 mil habitantes em 14 dias, seguido da República Checa (915) e de Espanha (843), para a média europeia de 359 casos. Para o futuro, enquanto a vacina não atende o esperado, a ordem é aumentar a capacidade de testagem, rastrear ao máximo os contatos e isolar os infectados. Só assim será possível pensar em retomar segurança a economia.

Enquanto isso, a Comissão Europeia começa a estudar medidas para reduzir as restrições a viagens e estimular o turismo no próximo verão, como certificado de imunidade ao coronavírus e teste rápido. Em outras palavras, garantir que os viajantes não sejam portadores do vírus.

Bem à frente da União Europeia, o Reino Unido comemora a vacinação de 15 milhões (ou 22%) dos britânicos, as pessoas mais vulneráveis, com a primeira dose. Com a vacinação e a queda drástica nas taxas de infecções, hospitalizações e mortes, o governo britânico já fala em aliviar as medidas de confinamento, em vigor desde o início de janeiro.

Exportador de nova variante do vírus até 70% mais mortal, a Inglaterra inicia hoje uma quarentena para passageiros de 33 países, entre eles Brasil, Portugal e África do Sul, na tentativa de barrar a entrada de novas variantes mais infecciosas como as de Manaus e da África do Sul. Só entram no país os cidadãos britânicos e residentes; antes de voltar para suas casas passarão 10 dias fechados num hotel perto do aeroporto e pagarão por isso quase 2000 euros mais os custos de dois testes covid e refeições em regime de takeaway.

Estados Unidos

Apesar da idade, Joe Biden é o presidente americano mais rápido em tomar decisões nos primeiros dias de governo, comparado aos anteriores, de acordo com levantamento do analista global Paulo Portas, da TVI portruguesa. Ações que vão desde a gestão da pandemia (aceleração da vacinação e anúncio de plano fiscal de US$ 1,9 trilhão para recuperar a economia) até ações que revertem decisões do antecessor sobre alterações climáticas, imigração e política internacional, como retorno ao acordo do clima e à OMS, fim da construção do muro na fronteira com o México, mudança nas regras de entrada de imigrantes e renovação por cinco anos do tratado de desarmamento nuclear com a Rússia.

A parte ruim, embora não tenha havido surpresa, foi que o Senado rejeitou, pela segunda vez, o impeachment de Donald Trump. O ex-presidente era acusado de incitamento à invasão do Capitólio, em 6 de janeiro, por parte de seus apoiadores, que ameaçaram membros do Congresso, inclusive republicanos, reunidos para formalizar a vitória de Biden nas eleições de novembro. Com 57 votos a favor e 43 contra a absolvição, os demecratas não conseguiram a maioria de dois terços necessária, o que deixa o caminho livre para Trump continuar na vida política e inclusive se candidatar de novo. Ele já se manifestou: O nosso movimento histórico, patriótico e belo ainda só começou.

O curioso é que, mesmo republicanos que votaram contra o impeachment, reconheceram a culpa de Trump na invasão do Capitólio. O líder dos republicanos no Senado, Mitch McConnell, votou pela absolvição, embora tenha considerado o ex-presidente culpado pela “incitação à insurreição. Resta saber qual será o futuro do Partido Republicano, dividido entre os trumpistas e os que rejeitam o populismo do ex-presidente.  

 

Rota Lisboa (1/2021) Pandemia, terceira onda e vacinas

04 de Janeiro de 2021, por José Venâncio de Resende 0

O bom exemplo da vice-presidente Kamala Harris que toma posse este mês nos EUA.

Ano novo, problemas velhos, temperados por grande dose de esperança. O mundo caminha para os dois milhões de óbitos decorrentes da pandemia do novo coronavírus. As explicações mais comuns são o surgimento de novas variantes mais infecciosas no Reino Unido e na África e os excessos cometidos nas festas de fim de ano.

O brutal aumento de infecções já está colocando em risco de colapso o sistema de saúde de vários países. Fala-se inclusive em terceira onda, tanto assim que governos europeus estão apertando o cerco, quer com restrições à circulação das pessoas, quer com ameaça de confinamento total.

As vacinas começaram a ser aplicadas no final do ano na Europa, nos Estados Unidos e em alguns países asiáticos. Mas ainda em quantidades modestas, em geral destinadas aos profissionais de saúde e funcionários e idosos de lares, e esporadicamente em pessoas de mais idade fora destas prioridades. Especialistas acreditam que dificilmente os resultados aparecerão antes do verão europeu (a partir de junho).

Um dos problemas principais é a escassez de doses, uma vez que a demanda é enorme e a produção limitada no curto prazo. A Pfizer, por exemplo, já alertou que terá dificuldades de cumprir o cronograma de entrega aos países europeus. Assim, corre-se para aprovar a vacina da Astrazeneca/Oxford, de maneira a ampliar a oferta. Só Portugal espera receber cerca de 20 milhões de doses este ano, o suficiente para vacinar toda a sua população (duas doses) e ainda deixar parte em estoque.

O Brasil continua sem um plano nacional de vacinação, o que transforma numa balbúrdia o combate ao coronavírus. O Instituto Butantan de São Paulo informou ter fechado o ano com quase 11 milhões de doses da vacina Coronavac (importadas ou em produção local), para vacinar prioritariamente os profissionais de saúde e idosos no âmbito do Estado. Mas já há uma corrida por parte de vários municípios brasileiros, ou consórcios de municípios, para encomendar a vacina.

O Butantan ainda aguarda informações da parceira chinesa Sinovac Biotech para entrar com solicitação de aprovação na Anvisa. Aliás, é impressionante o ruído de comunicação em torno desta vacina, com idas e voltas sobre o anúncio da taxa de eficácia, o que acaba por reforçar o discurso negacionista e preconceituoso do presidente Bolsonaro. De qualquer forma, o plano do governo paulista é iniciar a vacinação em 25 de janeiro, aniversário da capital.

Já a Fiocruz foi autorizada pela Anvisa a importar dois milhões de doses da Astrazeneca/Oxford, que começou a ser usada nesta segunda-feira (4) no Reino Unido, e, tão logo seja possível, iniciar a produção da vacina no Brasil. Esta vacina esteve envolta em polêmica por ocasião do seu anúncio em novembro passado. A farmacêutica Astrazeneca revelava eficácia entre 62% e 90% em análise preliminar. Alguns dias depois, nova análise apontou dúvidas, inconsistências e erros relacionados ao estudo clínico da fase 3, a última etapa antes da aprovação pelas agências regulatórias. A justificativa da empresa foi que uma parte dos voluntários recebeu apenas meia dose na segunda aplicação.

Agora, insinua-se que o governo britânico teria pressionado a agência reguladora para acelerar a liberação da vacina para o uso. Em comentário na noite de domingo (3) na TVI portuguesa, o analista Paulo Portas acrescentou que o governo britânico decidiu, à revelia do regulador, ampliar o intervalo de aplicação das duas doses, de 14 ou 21 dias para 12 semanas, a fim de tentar vacinar o maior número possível; o que parece uma medida de desespero diante dos mais de 50 mil casos diários de covid-19. Cautelosos, os reguladores europeu e norte-americano resolveram adiar para fevereiro/abril a avaliação da vacina, na expectativa de mais informações.

De qualquer forma, há esperança de que novas vacinas sejam aprovadas este ano, como a da farmacêutica Johnson & Johnson (vantagem de uma única dose). No Brasil, por enquanto, a esperança está depositada nas vacinas Coronavac e Astrazeneca/Oxford. Enquanto isso, a orientação dos especialistas é no sentido de continuar adotando as medidas preventivas (distanciamento social, máscaras etc.), tudo aquilo que Bolsonaro abomina e desrespeita, ostensivamente, dando um sinal trocado para seus admiradores e seguidores. 
    
 

Carta de Lisboa (2020): Resiliência e esperança

08 de Dezembro de 2020, por José Venâncio de Resende 0

Aquecimento global, desafio pós-pandemia (foto: tempo.pt).

Estamos no apagar das luzes de 2020, para muitos um ano perdido, para ser esquecido. Mas algumas vozes sensatas se erguem para dizer que é no mínimo um ano para reflexão, para aprendizado, para repensar nossas vidas e nosso futuro neste planeta Terra.

Alinho-me com estas vozes sensatas, e aproveito este fim de ano para fazer a minha reflexão em “voz alta”. Comecei 2020 com muitos planos. O primeiro deles, bem-sucedido, foi o lançamento, em Resende Costa (MG), do meu livro Cidades e Resendes – Uma viagem por Portugal continental, Arquipélago dos Açores, Minas Gerais e Cabo Verde.

O evento foi no sábado, 14 de março, sob alerta das primeiras orientações do Ministério da Saúde, em Brasília, para evitar eventos com grande ajuntamento de pessoas, manter o ambiente ventilado etc., que já levantava a ponta da cortina para o trágico espetáculo da pandemia. Mesmo assim, tudo correu bem no evento, com a presença de dezenas de amigos (pouco abaixo do limite de 100 então recomendado pelas autoridades de saúde) de Resende Costa, São João del-Rei, Lagoa Dourada, Belo Horizonte e de outras cidades vizinhas.

No dia 15 de março, voltei para São Paulo e não mais saí de casa até o início de maio quando retornei a Portugal, numa viagem tensa marcada pela indisciplina (falta de cuidados mínimos de proteção contra o novo vírus) de grande parte dos passageiros e maior duração, pois o voo fez escala não-habitual em Recife. Desde então, tenho mantido uma vida quase reclusa – com idas ao supermercado, caminhadas nos locais próximos e alguma atividade indispensável -, mesmo durante o verão quando a população se libertou da rigidez do confinamento imposta na maior parte do primeiro semestre, cujas consequências sentimos com o recrudescimento do número de casos e mortes (a chamada segunda onda) neste outono.

Antes da pandemia, estava planejado o lançamento do meu livro, em 16 de maio, na cidade de Resende, região portuguesa do rio Douro. Evento este que teve de ser adiado indefinidamente devido à primeira onda da pandemia que ainda continuava grave na Europa. Aliás, meu plano era promover três ou quatro lançamentos – além de Resende, em Vila do Porto (ilha de Santa Maria), Cabanas de Viriato (freguesia de Carregal do Sal), e talvez cidade de Praia, em Cabo Verde. Ficarão para outra oportunidade, quem sabe já em 2021!

Aproveitei este tempo para, além dos trabalhos rotineiros que realizo para o Jornal das Lajes, ler um pouco mais. Entre os livros lidos nos últimos meses, destaco a instrutiva História do Império Habsburgo, de Pieter M. Judson; a edição atualizada da insuperável A Ordem Mundial, de Henry Kissinger; o intricado O Pêndulo de Foucault, de Umberto Eco; o “jornalístico” O Escândalo do Século, de Gabriel García Márquez; o fabuloso Samarcanda, de Amin Maalouf; e atualmente o delicioso texto do escritor Arturo Pérez-Reverte em Uma História de Espanha. A maioria deles, encaminhada (ou em via de) à Biblioteca Municipal de Resende Costa.

O ano termina com as esperanças renovadas. Algumas vacinas promissoras começam a chegar em ritmo alucinante, ainda que em “conta-gotas”, numa prova indiscutível do papel cada vez mais relevante nas nossas vidas do avanço da ciência e da tecnologia. A distribuição de milhões de doses de vacinas ao longo de 2021será uma experiência desafiadora, vai exigir uma logística de complexidade gigantesca pouco vista. A vacina não é nenhuma bala de prata, como advertem especialistas, mas se acredita que vá criar as condições necessárias para transformar a pandemia numa espécie de epidemia como é o caso da gripe.

Daqui do meu canto, creio que tenha havido certa precipação ao se dizer que o mundo seria outro depois da pandemia de covid-19. Tudo indica que os problemas anteriores e os desafios para resolvê-los continuarão presentes no nosso cotidiano.

Um dos principais é o aquecimento global, com suas consequências tais como fenômenos climáticos mais frequentes e violentos. Este ano, verificou-se alguma redução na emissão de gases poluentes decorrentes dos combustíveis fósseis (petróleo e carvão), mas nada de tão extraordinário que pudesse aumentar nossa esperança de se queimarem etapas no combate às mudanças climáticas. O que significa dizer que, se nada for feito, a situação anterior à pendemia tende a voltar, agravada. Um exemplo é o surgimento de um novo tipo de lixo (as máscaras e luvas descartáveis), frequentemente encontrado no chão de praças e ruas de cidades, mostrando que pouco mudou o comportamento das pessoas.

Acredito no enfrentamento concreto do problema climático por ação contundente dos governos no sentido de criar legislação e políticas públicas adequadas para induzir à substituição do modelo econômico baseado no carvão e no petróleo (transportes, plásticos, indústria etc.), adotar uma educação escolar voltada à sustentabilidade e introduzir tecnologias poupadoras de recursos naturais. Ao mesmo tempo, de empurrar as pessoas para atitudes mais adequadas como mudança nos hábitos de consumo, produção de menos lixo e a sua separação, diminuição da dependência de veículos individuais movidos a derivados do petróleo e outras práticas benéficas ao futuro da humanidade. Se as pessoas não mudarem o comportamento em relação ao consumo e às suas ações no cotidiano, de nada vai adiantar o esforço dos governos.

Esperança transatlântica

Em meio a todo esse caos, estou esperançoso, sobretudo com a chegada de Joe Biden ao poder nos Estados Unidos e das vacinas à população de todos os países! Nesta ordem, porque a presença do novo presidente na Casa Branca dará mais racionalidade – até mesmo mais humanidade - às relações internacionais. Afinal, o mundo precisa superar logo esta pandemia, numa ação coordenada e inclusiva, e desanuviar o ambiente comercial e político, envenenado pelo trumpismo, para que os países voltem a crescer e gerar riqueza e novas oportunidades de trabalho, de preferência em condições sustentáveis. Claro assim! 

Enquanto Biden assume com uma equipe qualificada e experiente para lidar com os grandes problemas que nos afligem, Portugal assume em janeiro a presidência rotativa da União Europeia, com a seguinte pauta: liderar a fase inicial da distribuição eficiente e “justa” das vacinas entre os países da comunidade; colocar para funcionar a “bazuca” de bilhões de euros dos fundos europeus destinada à recuperação econômica pós-pandemia e levar adiante o programa europeu de desenvolvimento, com prioridade nas transições digital e climática.

Uma última palavra de esperança. Minha expectativa (ou sonho?) é de que os dirigentes brasileiros e seus aliados políticos ultrapassem a miopia ideológica e o negacionismo inconsequente e passem a atuar no sentido de tirar o país do previsível isolamento, delineado com a derrota do aliado Donald Trump nos Estados Unidos e com o crescente cerco na Europa às democracias iliberais como Hungria e Polônia.     

 

ROTA LISBOA (11): O que esperar de Joe Biden

08 de Novembro de 2020, por José Venâncio de Resende 0

O presidente eleito Joe Biden e sua vice Kamala Harris.

O governo português está animado com a vitória de Joe Biden. Afinal, o novo presidente dos Estados Unidos toma posse em janeiro, mês em que Portugal assume a presidência rotativa do Conselho da União Europeia.

O que muda com a eleição de Joe Biden? Duas frases do seu discurso de vitória resumem bem o que se espera do novo governo: restaurar a alma da América e voltar a ser o farol do mundo. Para resumir, a volta à normalidade. 

Internamente, Biden terá dificuldades para governar pois vai encontrar um país dividido. De um lado, Trump mesmo perdendo saiu fortalecido nestas eleições em relação há quatro anos, consolidando o chamado “trumpismo”. Ampliou o seu eleitorado, dos chamados “órfãos” da globalização, mesmo não cumprindo grande parte de suas promessas, a outros segmentos como o dos hispânicos. 

Por sua vez, Biden enfrentará dupla dificuldade: de um lado não terá maioria no Senado e, com o país polarizado, terá dificuldade de diálogo apesar da sua vasta experiência e de ter origem no próprio Senado. Outra dificuldade é que a Suprema Corte é majoritariamente conservadora. Também no interior do Partido Democrata a polarização dificultará as ações de Biden, na medida em que a esquerda mais radical manifeste certa impaciência com a sua moderação. 

No âmbito internacional, a palavra-chave de Biden será a restauração das alianças, como resume o comentarista global Paulo Portas da TVI. Ou como disseram o jornalista Fernando Gabeira e o prefeito de Londres, Sadiq Khan, é hora de retomar a construção de pontes, e não muros. A administração Biden deverá não só abandonar as decisões unilaterais do governo Trump, mas também deverá retomar os contatos com entidades supranacionais como Organização Mundial do Comércio (OMC) e Organização Mundial da Saúde (OMS).

Outras decisões serão o retorno ao Acordo de Paris, a reaproximação da União Europeia, a melhoria das relações no âmbito da NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte), a retomada da política de Obama para o Oriente Médio e das negociações do acordo comercial Ásia-Pacífico como forma de contrabalançar o peso da China. Aliás, a relação com a China não terá vida fácil, mas será menos crispada. O que será bom para países como o Brasil. 

“O desfecho da eleição nos Estados Unidos parece indicar algo mais do que a simples rejeição ao populismo nacionalista. Parece indicar que não há saída para a crise econômica e social dos nossos dias senão a cooperação, o diálogo, a negociação e a busca de saídas multilaterais” (Celso Ming, O Estado de S. Paulo, 07/11). 

Nesse sentido, pode-se dizer que entraremos numa nova fase na luta mundial para travar a pandemia. A tendência é que o governo Biden promova uma coordenação nacional com governos estaduais e instituições científicas e, no âmbito internacional, uma frente integrada com a OMS e indústria farmacêutica não apenas para atacar de imediato o coronavírus mas principalmente para adotar uma política de distribuição das eventuais novas vacinas de maneira a não deixar ninguém para trás. A visão trumpiana de “America first” parece superada. 

Pandemia, clima e economia

A perspectiva de uma nova visão nacional no combate à pandemia reforça, no ambiente doméstico, a importância da aprovação pelo Congresso dos Estados Unidos da proposta de novo pacote de alívio ao coronavírus (auxiliar os americanos atingidos pela pandemia), em valor superior a 2,2 trilhões de dólares, que enfrenta resistência dos republicanos. Será que agora, com a eleição definida, este pacote venha a ser aprovado?

O mesmo vale para a questão ambiental. No plano interno, o desafio é aprovar uma proposta de incentivos à substituição da energia fóssil pela energia renovável num Senado de maioria republicana. A volta ao Acordo de Paris significa que o país terá uma visão integrada das políticas de combate às mudanças climáticas, e não apenas ações isoladas de governos estaduais. Ao mesmo tempo, aumentará a pressão sobre o Brasil em relação às políticas voltadas para a Amazônia. Haverá boa vontade em contribuir com recursos financeiros para preservar a floresta desde que o governo brasileiro reverta a sua diretriz “de deixar passar a boiada”. 

No plano econômico, há uma visão de que travar o coronavírus – a proposta de Biden - não conflita com a retomada do crescimento econômico. As propostas de Biden basicamente prevêem aumento de impostos para empresas (de 21% para 28%), revertendo medida de Trump, taxação mínima sobre lucros estrangeiros (21%), acima dos atuais 10,5%, e incentivo fiscal (até 10%) para investimentos na produção nacional. Por outro lado, há um plano dos gastos públicos para recuperar a economia, a começar pelo pacote de estímulos que já se encontra no Congresso. O retorno ao crescimento da economia norte-americana beneficia todos os países, inclusive ao Brasil. 

ROTA LISBOA (10): Pandemia e estado de emergência na Europa

07 de Novembro de 2020, por José Venâncio de Resende 0

Hospitais à beira do colapso, embora melhor preparados (foto: Jornal de Negócios).

No dia (6/11) em que o presidente Marcelo Rebelo de Sousa anunciou o estado de emergência, a pandemia bateu novo recorde em Portugal (mais 5.550 casos de covid-19 e 52 mortes), segundo relatório da Direção-Geral da Saúde. Nota-se que uma preocupação ficou patente neste segundo estado de emergência nos oito meses de pandemia: limitar ao máximo a abrangência do estado de emergência.

O Parlamento votou a proposta e o presidente reiterou, em discurso à nação, que as medidas serão muito limitadas e de caráter preventivo. Uma das características deste segundo estado de emergência foi a busca de convergência entre a Presidência, o Governo, a Assembléia da República, os partidos e os parceiros sociais. “O estado de emergência tem por objetivo conciliar a vida e a saúde com o emprego, o salário e o rendimento dos micro, pequenos e médio empresários, mais em risco nestes tempos difíceis, afirmou o presidente.

As medidas aprovadas prevêem limitações à circulação (recolher obrigatório) nos municípios com nível mais elevado de risco; interdição das deslocações (exceção às justificadas para desempenho profissional, cuidados de saúde, frequência à escola, abastecimento de bens e serviços e outras); utilização pelas autoridades públicas competentes dos recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde integrados nos setores privado, social e cooperativo, mediante justa compensação; mobilização dos funcionários públicos para a realização de serviços de apoio à saúde; medição de temperatura por meios não invasivos e realização de testes de diagnóstico à covid-19” nos locais de trabalho ou serviços e instituições públicas, estabelecimentos educativos, meios de transporte, espaços públicos (comerciais, culturais etc.) e pessoas “acolhidas” (estruturas residenciais, de saúde, prisionais, centros educativos e seus trabalhadores); e requisição das Forças Armadas e de Segurança  para ajudar as autoridades de saúde.

Como determina a Constituição, o estado de emergência deve durar 15 dias (a partir de 9/11), podendo ter eventuais renovações com o mesmo limite temporal. É um estado de emergência decidido com os olhos voltados para salvar o Natal, tão caro aos portugueses. Mas, acima de tudo, para tentar atenuar o custo da pandemia na vida, saúde e economia. Resta saber se daqui a 15 dias (a partir de 9/11) o estado de emergência terá surtido algum efeito, em termos de redução do número de casos e de mortes – desaceleração da curva ascendente - ou terá de ser endurecido.

Europa

Neste início de novembro, já são cerca de 20 países que fecharam ginásios, restaurantes, museus e outros locais, introduziram recolher obrigatório, proibiram as pesssoas de sair para serviços não essenciais ou tudo isso junto. A França, por exemplo, proibiu reuniões sociais e reprimiu todo tipo de saída de casa senão para comprar comida, remédios ou ir à escola. Mesmo a Suécia, que teve uma abordagem mais leve na primeira onda, limitou o tamanho dos grupos em restaurantes e desencorajou encontros familiares.

No Reino Unido, o primeiro ministro Boris Johnson mudou de curso em 31 de outubro, depois que cientistas do governo alertaram que a doença mataria até 4 mil pessoas por dia na semana anterior ao Natal. Isto seria um “desastre moral e médico”, de acordo com Johnson, com hospitais lotados e médicos tendo de escolher a quem salvar.

De maneira geral, uma diferença importante entre as medidas de agora e aquelas da primavera passada é que escolas e universidades continuam abertas. Outra é que desta vez é o inverno que está chegando, com as inerentes condições adversas de atividades externas e de agitação contidas.

Acredita-se que estes confinamentos de agora serão menos efetivos do que os da primeira onda, quando as restrições foram mais fortes e as pessoas confinadas estavam menos cansadas e mais predispostas a precauções restritivas. Isto aumenta a necessidade de os governos fazerem o melhor para gerir a crise com menos danos inclusive emocionais e morais.

O aprendizado da primeira onda, novos instrumentos, como maior disponibilidade de testes rápidos e mais baratos, e novos tipos de tratamento reduzem o risco de severidade  da doença e oferecem novas oportunidades de profilaxia. E há principalmente a esperança da vacina. Tudo isso pode ajudar no moral das pessoas que se submetem aos contrangimentos deste tempo.

Fonte: TVI, The Economist e Euronews

LINK:

A fala do presidente de Portugal - https://tvi24.iol.pt/politica/06-11-2020/marcelo-rebelo-de-sousa-fala-em-estado-de-emrgencia-sem-confinamentos-compulsivos