Contemplando as Palavras

Mestres da arte e da vida

17 de Outubro de 2014, por Regina Coelho 0

Professar e professorar são verbos registrados nos dicionários com várias acepções. A mais comum é a que define esses termos como “trabalhar como professor, ensinar, lecionar”. Com esse sentido, há muita gente trabalhando por aí, desde os convencionais profissionais da educação, passando pelos instrutores que dão aulas de informática, de artes marciais, de natação, de pintura, de costura e uma infinidade de outras práticas. E essa onda chegou aos clubes e estádios de futebol do Brasil, onde o técnico é respeitosamente chamado de professor por seus comandados.

Um giro em algumas áreas do entretenimento revela como e o quanto a figura desse profissional é representada no exercício de seu ofício. Criaturas ficcionais nascidas de criadores, situações e momentos tão diversos, os professores aqui selecionados formam um “corpo docente”, no mínimo, bastante eclético.

Pra começar, quem não se lembra, por exemplo, de um certo professor de voz rouca, aquele do “vapt vupt” ou do “E o salário, ó!”? A criação do programa de humor Escolinha do Professor Raimundo, em 1952 pelas mãos de Haroldo Barbosa para a Rádio Mayrink Veiga fez surgir o talento de Chico Anysio na composição de Raimundo Nonato. Ganhando versão para a tevê (TV Rio) em 1957, dentro do programa Noites Cariocas, o formato solo, já na Globo teve estreia em 1990. Nele, tipos variados de alunos em salas de aula comandada pelo amado mestre de Rolando Lero (personagem do saudoso Rogério Cardoso) garantiram a diversão do público até 2001. Vem do seriado Chaves o romântico professor Girafales. Eterno pretendente de Dona Florinda, ele foi interpretado por Rubén Aguirre Fuentes, ator mexicano, hoje adoentado e afastado do trabalho.

Saindo dos humorísticos, a professora Clotilde também deixou sua marca. Interpretada por Maitê Proença na novela O Salvador da Pátria (1989), de Lauro César Muniz, ela é uma professora universitária que, em contato com analfabetos para desenvolver sua tese, envolve-se com um deles, o boia-fria Sassá Mutema (Lima Duarte), que também se encanta por ela. Igualmente encantadora, a professora Helena (Gabriela Rivero), de Carrossel (versão original mexicana exibida em 1989) é a perfeição em pessoa junto a seus alunos com seu jeito doce, amoroso e conciliador.

Ainda na televisão e infelizmente sem grandes números na audiência, o excelente Rá –tim-bum, programa infantil levado ao ar pela TV Cultura entre 1990 a 1994 tem no professor Tibúrcio (Marcelo Tás) sua figura central. Ao conclamar seus alunos para a aula usando seu bordão Olá, classe!, ele personifica o professor nada convencional que ensina a eles de maneira lúdica noções de higiene pessoal, ecologia, cidadania, português e matemática.

Da literatura infantil brasileira duas professoras se destacam. Uma delas é Dona Cecília Paim, personagem de O Meu Pé de Laranja Lima, um clássico infantil das nossas letras, de José Mauro de Vasconcelos, publicado em 1968. Considerada feia, Cecília nunca recebia flores dos alunos, mas, bondosa e sensível, conquista o coração do menino Zezé (o protagonista da história), que passa então a lhe oferecer diariamente uma flor roubada de certa casa, detalhe descoberto mais tarde por ela. Uma bonita troca de afetos esse momento. Já da cabeça maluquinha de Ziraldo saiu a professora Maluquinha (Uma Professora Muito Maluquinha, 1995). Com seus revolucionários métodos de ensino, ela transforma em brincadeira suas aulas e defende a leitura como instrumento principal para o conhecimento do mundo. Sábia maluquinha ela, não?

Criado em 1952 pelo desenhista Carl Barks para a Walt Disney Company, o professor Pardal é o representante animal dessa relação de “teachers” (professores). Na verdade, ele é um galo antropomorfo, ou seja, com forma de humano. Como inventor da fictícia Patópolis, é meio atrapalhado, sendo quase sempre salvo de suas experiências nem sempre bem sucedidas por seu simpático assistente Lampadinha, amigo eletrônico inventado pelo famoso professor.

Dos gibis para o cinema, entra em cena o professor John Keating. No belíssimo filme Sociedade dos Poetas Mortos (de 1989, dirigido por Peter Weir), é Robin Williams, um dos maiores artistas dos últimos tempos, falecido em agosto último, o responsável por dar vida a esse professor de inglês e literatura nem um pouco tradicional. Chamado de meu capitão pelos alunos, pela forma como eram conduzidos a buscar a luz do saber, Mr. Keating inspira-os a perseguir suas paixões individuais e a fazer de suas vidas uma coisa extraordinária. Grande inspiração para todos nós esse seu olhar sobre a existência humana.

Realidade de volta, lembremos os bons professores de cada dia, de todos os tempos, de perfis tão diversificados, em todos os lugares, para sempre lembrados na memória dos que se reconhecem transformados pela orientação segura de seus mestres.

Conjurados – 50 anos – Não posso perder a oportunidade de me juntar àqueles que comemoram neste mês de outubro os 50 anos de existência da Escola Municipal Conjurados Resende Costa. Nela vivi inesquecíveis anos como aluna, voltando a ela tempos depois para iniciar minha vida profissional como professora, aí permanecendo por muito tempo. Sou, portanto, prata da casa, orgulhosa dessa condição.

 

De tradição cinquentenária, a E. M. Conjurados desempenha no município um trabalho fundamental na área da educação sendo também referência afetiva na vida de muitos resende-costenses que construíram com ela belas histórias.

Nos corredores do consumo

17 de Setembro de 2014, por Regina Coelho 0

   Ir com frequência a supermercados é uma tarefa a que se entrega muita gente. Faço parte desse grupo. E da mesma forma que tenho a ginástica e a caminhada como atividades externas de rotina, pratico também compras para o lar. Longe de ser uma inveterada consumista, não me livro, no entanto, de ter sempre de comprar alguma coisa nesses mais do que nunca verdadeiros templos do consumo. É que, além do que é comprado regularmente, a gente não consegue escapar de ir atrás daquele item que faltou na lista ou que já foi consumido e deixamos de repor e que pode nos fazer falta a qualquer hora. Afinal, prevenir é melhor. O problema é que ter a despensa totalmente abastecida pode exigir idas e mais idas ao supermercado.

   Ser frequentador desse tipo de espaço envolve algumas vantagens. Pra começar, a intimidade física com o lugar encurta caminhos entre os corredores, já que a pessoa sabe exatamente onde fica o que vai comprar, fator que propicia ganho de tempo. Outro ponto a destacar nessa busca quase diária por alguns poucos produtos é que é possível, ou melhor, é certo encontrar novidades e promoções. Aí, fica difícil resistir à tentação de comprá-las e quase sempre a gente sai carregando mais coisas do que o pretendido inicialmente. Há ainda uma situação bastante interessante nisso tudo, principalmente em se tratando de compras de muitos artigos, o que requer mais tempo, favorecendo assim a conversa com os outros que estão próximos de nós, sejam eles também clientes ou funcionários da casa. Nessa hora inevitável de empurrar o carrinho e escolher os produtos que serão comprados, muita prosa boa acontece, sem necessariamente envolver conhecidos entre si.

   Assunto, aliás, é o que não falta nesses momentos vividos entre bancas e mais bancas de frutas, verduras e legumes; entre gôndolas e mais gôndolas confundindo às vezes os olhos pela variedade de mercadorias com seus preços, rótulos e formatos igualmente variados. Na pauta do que é conversado, não faltam comentários sobre os preços e as altas de certos produtos bem como as qualidades de determinadas marcas. Sobre esse último aspecto, é curioso observar como as pessoas propagam suas marcas preferidas. Trata-se da famosa e eficiente propaganda de boca, ela sim, nada enganosa, pois é resultado do que já foi testado e aprovado. Além de tudo, é gratuita. Para o fabricante, é claro. Dependendo da prosa, muitas vezes influenciada pela proximidade com os produtos expostos, surge a oportunidade de alguém ao lado da gente sugerir ou receber uma receita de bolo, doce ou pão de queijo, por exemplo. Dicas ligadas à saúde podem significar a compra imediata de certos itens apregoados como excelentes para combater isso ou aquilo. Afinal, não nos custa nada levá-los para casa e experimentá-los.

   Saindo do âmbito das compras propriamente ditas e das conversas que elas sugerem, pode-se dizer que o supermercado é lugar certo para os encontros casuais porque, além das pessoas que a gente encontra constantemente, há aquelas com quem surpreendentemente nos deparamos e não víamos há tempos. Sendo alguém ligado a nós, pronto! É papo na certa, com casos e mais casos contados de lado a lado. Na distração ou no entusiasmo do momento, vale até esquecer por um instante o principal motivo da nossa presença naquele lugar para encontrar pessoas queridas, entre as muitas que circulam pelas dependências do estabelecimento.

   E onde grupos se formam, notícias frescas se espalham com rapidez. Não faz muito tempo, ocupada com a escolha de determinado produto, fui surpreendida por alguém ao me tocar o ombro para sussurrar em primeiríssima mão que Fulana de tal havia acabado de morrer. Levei um susto daqueles não exatamente pela notícia recebida que, de certa forma e infelizmente, já era esperada. Estranhei o jeito como fui abordada, quase como uma necessidade dos que não conseguem deixar de passar pra frente qualquer informação que seja.

   Pensando bem, os supermercados atuais representam muito mais do que simples centros de abastecimento. De uns tempos para cá, fortalecidas com a prestação de variados serviços de atendimento ao consumidor em suas áreas de cobertura, essas casas de comércio pouco lembram os antigos armazéns (ou os quase saudosos secos e molhados) com seus fregueses atendidos exclusivamente no balcão. A propósito, independência, por exemplo, é a palavra-chave ligada à clientela de hoje, que se movimenta enquanto faz suas compras e imprime seu próprio ritmo nessa tarefa, com liberdade para checar os objetos de seu desejo e decidir, sem a influência de terceiros, pelo que será levado para casa. Nesse mexe e remexe de mãos consumistas, muita mercadoria muda de prateleira, eufemismo para bagunça provocada por clientes em certas partes do supermercado. E quem é que, diante de tanta movimentação, não se viu em apuros com a perda (momentânea, quase sempre) de objetos pessoais como óculos, celular, chaves e até carteiras?

   Tudo tão prático, tão rápido hoje! E muito consumismo na ordem do dia.

 

   Em festa - Líder de um clube de meninas, Luluzinha é uma personagem de histórias em quadrinhos e desenhos animados criada nos EUA em 1935. Ao longo dos anos, seu nome saltou da ficção para virar sinônimo de tudo o que se relaciona ao mundo feminino. Surgiu daí a inspiração para ser batizado de “Turma das Luluzinhas” um grupo de amigas que passou a se encontrar em alegres e festivas ocasiões em que se celebra a oportunidade feliz de estar bem entre pessoas queridas. Passados exatos 10 anos da criação da turma, não pode faltar comemoração.

   Vivas a nós, mulheres de histórias tão diversas, pelo afeto que nos une. Diferentemente da Little Lulu (Luluzinha) – criação de Marge Buell – sempre em guerra com o Bolinha, seu contraponto masculino, não queremos disputar com os homens o que pode ser parceria entre pessoas. Só queremos seguir Vinícius de Moraes, para quem “a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida”. É isso aí, Poetinha! Parabéns, Luluzinhas! E que haja pela vida muitos outros bons encontros entre nós.

Turistas estrangeiros à vista

13 de Agosto de 2014, por Regina Coelho 0

De uns tempos para cá, impulsionado pelo crescimento do artesanato têxtil local, o turismo em Resende Costa ganhou força. Até então conhecido restritamente como a terra dos inconfidentes José de Resende Costa (pai e filho) ou a cidade assentada sobre rochas, de onde se vê em certo ponto da Laje belo pôr do sol, o município entrou na rota dos que viajam a passeio pela região do Campo das Vertentes.

Principal porta de entrada da cidade, a Avenida Alfredo Penido, que os resende-costenses costumam chamar de Asfalto ou Rua do artesanato, é um corredor por onde circulam geralmente os turistas que Resende Costa recebe, atraídos, é claro, pela grande variedade de produtos expostos nas lojas concentradas no local, à espera dos compradores em potencial.

E de onde vem essa gente? Logicamente, das mais variadas partes do estado e de outros estados brasileiros também. Dos que vêm do exterior, de acordo com o anunciado na edição passada, a coluna passa a tratar agora, sem qualquer pretensão de produzir uma análise mais aprofundada sobre o assunto. Conversas aqui e ali com o pessoal que mantém contato profissional com os nossos visitantes renderam informações interessantes e depoimentos como o do artesão Luís Cláudio. Segundo ele, Resende Costa já recebe turistas estrangeiros, mesmo antes de todo o movimento com relação à preparação para a Copa. “Já tive a oportunidade de presenciar a visita de franceses, argentinos, ingleses e portugueses. Quando estive à frente da Associação dos Artesãos, chegamos a efetuar vendas também para o Canadá e a Itália. Recentemente, recebemos um casal de americanos interessados na comercialização de artesanato”, afirma.

Considerando a origem desses turistas, o resultado de nossa breve pesquisa revelou a predominância de americanos (dos Estados Unidos) e de sul-americanos (principalmente do Chile e da Argentina) visitando Resende Costa, na maioria das vezes, viajando em grupos menores de amigos ou em família. Curiosamente, no dia da entrevista para esta matéria com as funcionárias Bianca Lombelo, Greicy Camila Resende e Thaís Bento de Andrade, que trabalham na DCorações Artesanato, a loja havia atendido três turistas espanholas acompanhadas de uma brasileira. No mesmo dia, 23 de julho próximo passado, a vendedora Adriana Coronel registrou a presença de um senhor japonês (que mora no Japão) na Oficina de Pijamas. Ela lembra que, acompanhado do filho (que vive em São Paulo) e sem falar português, o homem era só sorrisos, fotografando tudo.

Aliás, quando perguntados sobre como acontece a comunicação deles com os brasileiros, as respostas dos entrevistados não variam muito. Para Ermelinda Amaral, que trabalha como caixa na Churrascaria Ramona, "sempre tem um intérprete ou amigo que fala a nossa língua e faz o intercâmbio". Esse comentário é confirmado pelas meninas da DCorações Artesanato, acrescentando ainda que acontece também de eles só olharem os produtos, vendo eles mesmos os preços e conversando entre si. Já Adriana afirma que “muitos falam um pouco de português e que pelo menos o básico eles dão conta de perguntar e manejam bem o nosso dinheiro”. Luís Cláudio reforça ainda que, na maioria das vezes, esses visitantes chegam aqui através de agências de turismo, e elas disponibilizam profissionais para acompanhá-los, ou seja, são guias que atuam também como intérpretes.

E como é do conhecimento quase geral dos resende-costenses, esses e os turistas brasileiros que visitam nossa cidade saem, em grande parte, de Tiradentes e São João Del Rei, onde normalmente se hospedam e recebem indicação sobre o lugar, chegando a Resende Costa já informados sobre o nosso artesanato. No pacote, estão as cidades da região que oferecem outros atrativos para essas pessoas, garantem nossos entrevistados. Exemplo disso é o caso contado por Eurides Lopes Ferreira, garçom da Churrascaria Ramona, que atendeu um casal chileno e seus três filhos. Conforme relato do Eurides, o homem trabalha em uma multinacional, tendo sido transferido para Belo Horizonte. Quando chegou a Resende Costa, a família já havia passado por Tiradentes.

Nossos colaboradores na produção desta matéria observam que esses turistas vindos muitas vezes de tão longe são educados e curiosos, querendo saber o que é cada produto do artesanato e qual a utilidade de cada um. Simpáticos, eles sorriem quando não conseguem se comunicar com palavras ou gestos. Aliás, esse parece ser o perfil bem típico do turista, acrescido de outras características que não vêm ao caso agora.

Uma constatação final merece nossa reflexão. O turismo em Resende Costa vem se confundindo com o artesanato. Em outras palavras, muita gente que nos visita fica restrita à área das lojas do Asfalto sem andar pela cidade e conhecê-la de fato, o que é uma pena. Por que isso acontece? Em pauta, a vocação turística do município como um todo.

 

P.S.: Agradecimentos às pessoas citadas na matéria. E ao Heliando (garçom da Churrascaria Ramona), à Silvânia Machado (artesã) e à Solange e ao Iraci, proprietários do Irassol – Restaurante e Pousada.

Salada linguística no cardápio da Copa

16 de Julho de 2014, por Regina Coelho 0

“Excuse-me, aí.” Agente de trânsito, brasileiro, abordado por repórter do jornal Folha de São Paulo que se passou por turista estrangeiro.

“Muito obrigada a ocê!” Paula Marizales, arquiteta colombiana, interrompendo seu almoço tipicamente mineiro num restaurante na Savassi, em Belo Horizonte, para conversar com repórter local, ao lhe agradecer a entrevista, arriscando imitar o sotaque mineiro.

As situações acima podem ser multiplicadas em muitas outras parecidas que se observaram no país durante a Copa de 2014 no quesito comunicação. De um lado, postam-se os donos da casa, que se viraram do jeito que puderam para receber as visitas, valendo, por exemplo, juntar o inglês com o português, mesmo sendo um teste, como no primeiro caso. Do outro lado, colocam-se os visitantes, que não fizeram por menos, incorporando, por exemplo, até regionalismos, como se vê no segundo caso.

É verdade que esse período de convivência envolvendo brasileiros e estrangeiros não se resumiu a esforços pessoais e atitudes simpáticas de lado a lado no intuito de se fazerem entender principalmente por palavras e outros artifícios como gestos e expressão facial, que são mecanismos naturais de comunicação. Desencontros linguísticos foram inevitáveis pela própria natureza globalizada do encontro de tantos falares, ainda que, nos dias atuais, tenham sido encurtadas as distâncias entre os idiomas e entre seus falantes motivadas pela própria globalização.

Quando se trata especialmente da comparação entre o português e o espanhol, idiomas tidos como próximos e falados por onze seleções do Mundial 2014 e suas torcidas – Brasil e Portugal (português), Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Espanha, Honduras, México e Uruguai (espanhol), algumas considerações são necessárias. Segundo a chilena Sara del Carmen Rojo de la Rosa, professora da Faculdade de Letras da UFMG, “brasileiros e hispanos acham que podem falar a outra língua com facilidade, mas isso é falso. Essa semelhança é como uma armadilha. A palavra exquisito, por exemplo, significa uma delícia. Se um hispano falar que a comida está exquisita, o brasileiro vai entender outra coisa”. Além disso, há os falsos cognatos, termos de ortografia idêntica ou quase, mas com significados diferentes em cada uma das duas línguas. Vejamos alguns deles com seus respectivos significados em espanhol: aceitar (pôr azeite, passar óleo), aderezo (tempero), apellido (sobrenome), cuello (pescoço), embarazada (grávida), largo (comprido) e vaso (copo). Além disso, os termos têm sutilezas semânticas muitas vezes difíceis de captar quando alguém não é nativo do país. “As palavras têm uma história cultural. Vão além do que significam no dicionário. Em português, por exemplo, quando se fala que uma mulher é bonitinha, sabemos que ela não é maravilhosa ou superbonita. Já um hispano não consegue entender isso”, explica a professora Sara de la Rosa. Na falta de um conhecimento mais aprofundado de uma ou outra língua, as pessoas costumam apelar para o “portunhol”, uma “língua” intermediária entre o português e o espanhol, o que pode complicar a boa comunicação entre os envolvidos, já que costuma ser mais difícil de ser entendido.

E como se não bastasse a mistura de línguas, uma verdadeira babel em que se transformou o Brasil nas cidades que receberam os jogos da Copa, torcedores estrangeiros e brasileiros tiveram de conviver ainda com as diferenças linguísticas regionais presentes no país. Nesse ponto, contribuímos com o “mineirês”. Na percepção do argentino Gustavo Román, que é morador de BH, “aqui (em Minas) falam rápido, cortam as palavras. Falam pela metade, tudo mais curto, reduzido”. E ele tem razão. E nós também, que assim sendo, conservamos um traço natural da nossa identidade mineira.

De tudo o que aqui foi exposto, interessa, acima de tudo, ver a Copa do Mundo como uma época de troca, de interação entre todos de alguma forma nela envolvidos, independentemente das bandeiras que carreguem. E que as barreiras linguísticas sejam sempre quebradas em nome da boa aproximação e do necessário entendimento entre as pessoas. Nesse sentido, somos todos vencedores.

Para finalizar, lanço mão do depoimento de Sirlene Afonso, barraqueira em Copacabana, Rio, um dos redutos de torcedores do exterior durante a Copa. Seu comentário sobre o diálogo que manteve com um desses turistas resume com perfeição o alegre e caloroso espírito brasileiro de tratar as visitas. De quebra, com direito a uma leve investida no inglês e aquele tom professoral de quem tem sua própria dica e a ensina para os interessados na conversa com os estrangeiros. Vamos a ele:

“ - Um gringo veio me pedindo four (quatro) ‘caipiranha’, aí eu ri muito e disse ‘é caipirinha!’ Se falar pausadamente, eles aprendem e entendem.”

PS: No embalo da onda recente de estrangeiros passando pelo Brasil, na edição de agosto, a coluna tratará da presença deles a passeio em Resende Costa.

Papo de bola

13 de Junho de 2014, por Regina Coelho 0

Decorridos 64 anos, o Brasil volta a sediar uma Copa do Mundo, que já tem bola rolando nas 12 cidades escolhidas para receber os jogos. E é claro, nesse período de tempo, muita coisa mudou. Polêmicas e protestos envolvendo a realização desse gigantesco evento no país deixados momentaneamente de lado, quase tudo hoje é diferente. E se assim é, que no confronto final dê Brasil, diferentemente do que ocorreu no fatídico 16 de julho de 1950, quando a seleção brasileira caiu diante da seleção uruguaia em pleno Maracanã, aliás, Maracanazo (em espanhol). Esse termo foi usado pelos uruguaios em referência à partida que decidiu a Copa daquele ano a favor deles e é uma espécie de gozação dos hermanos a nós.

E foi justamente o Maracanã o maior símbolo daquela Copa. Com capacidade para receber quase 10% da população do Rio de Janeiro em 1950, conforme censo da época, o estádio foi comparado ao Coliseu (de Roma) pelo então presidente da Fifa, Jules Rimet, durante visita às obras em 1949. Cinco construtoras e 3500 operários levantaram o maior estádio do mundo em apenas 22 meses. Entre os trabalhadores estava o saudoso resende-costense Vicente (do Zé Brás), que certa vez me disse sentir o maior orgulho disso. A rapidez com que o Maracanã foi construído, que foi inaugurado ainda inacabado e cheio de andaimes (qualquer semelhança com as obras da Copa atual não é mera coincidência), fez com que muitos moradores do Rio temessem que a obra tivesse problemas estruturais e não resistisse ao primeiro jogo. Para tranquilizar a população, 3 mil funcionários foram convocados para pular simultaneamente nas arquibancadas, antes da abertura do torneio.

Histórica derrota consumada em casa, quiseram os deuses do futebol que o Brasil se sagrasse campeão longe da torcida – em 58, na Suécia, repetindo a façanha no Chile em 62 e trazendo do México, em 1970, o tricampeonato. E se até então os torcedores do Brasil acompanhavam os jogos da seleção canarinho apenas pelo rádio, em 70, a Copa do Mundo foi transmitida pela tevê, ao vivo, pela primeira vez para o país todo, via Embratel. Na ocasião, pouquíssimos e privilegiados telespectadores no Rio, em São Paulo e em Brasília puderam assistir às partidas em cores através de transmissões experimentais desse sistema.

Particularmente, guardo algumas lembranças da conquista do tri. Uma delas me remete aos dias dos jogos do Brasil. Em nossa casa, os bancos compridos da varanda eram levados para dentro de casa e colocados como arquibancadas em uma sala, diante da televisão, para receber a torcida que ali se reunia – meus pais, eu e meus irmãos, alguns vizinhos e conhecidos. Ver Pelé, Tostão e o time todo jogando era uma festa para os nossos olhos.

E não é que o Tostão, um dos maiores craques do futebol de todos os tempos, veio parar aqui em Resende Costa? Isso se deu em 1968, quando ele foi paraninfo de uma turma do antigo Ginásio Nossa Senhora da Penha. Foi aquele alvoroço na cidade a chegada dele. Pelo que se sabe, o intermediário de sua vinda a Resende Costa foi o Dr. Geraldo Magela Resende, de quem o genial jogador havia sido aluno no Municipal da Lagoinha.

Craques vão, craques vêm, mesmo havendo, para os saudosistas do futebol, carência deles atualmente no Brasil. Mas é fato que num país de tanta tradição como o nosso, em tempos de Copa do Mundo, tudo gira em torno dessa competição, assunto em pauta na maioria das conversas. O entusiasmo dos brasileiros com tudo isso, no entanto, não tem sido lá essas coisas.

Sucesso mesmo são os álbuns de figurinhas dos jogadores das seleções participantes espalhados por aí, uma verdadeira febre entre os fãs da prática de colecionar figurinhas (ou cromos) e completar os tradicionais álbuns. Logo, logo, começam a aparecer os bolões esportivos feitos de modo informal, principalmente pela molecada. A esse respeito, meu irmão Elmo me contou ter sido um desses garotos na Copa de 1962, ao organizar um bolão para o Brasil X Tchecoslováquia (atual República Tcheca e Eslováquia), jogo da primeira fase disputado no dia 2 de junho, com o placar de 0 X 0, que não foi bancado por apostador algum. Mas, segundo o Elmo, nosso pai não permitiu que ele ficasse com o dinheiro todo do bolão, convencendo-o a repassar para a Conferência de São Vicente de Paula a porcentagem anteriormente destinada a quem acertasse o resultado do tal jogo. Coisas de um vicentino daqueles bem convictos.

Ainda e finalmente no campo dessas curiosidades, segue abaixo a lista dos slogans que vão rodar pelo país afixados aos ônibus das 32 equipes do Mundial 2014:

Alemanha

Um país, um time, um sonho.

Argélia

Guerreiros do deserto no Brasil.

Argentina

Não somos um time, somos um país.

Austrália

Socceroos: pulando nosso caminho para a glória.

Bélgica

Espere o impossível.

Bósnia

Dragões no coração, dragões em campo.

Brasil

Preparem-se o hexa está chegando!

Camarões

Um leão sempre será um leão.

Chile

Chi, chi, chi, le, le, le, Viva Chile!

Colômbia

Aqui não viaja uma equipe, viaja um país.

Coreia do Sul

Vamos nos divertir, Vermelhos!

Costa do Marfim

Elefantes rumo ao Brasil.

Costa Rica

Minha paixão é futebol, minha força é meu povo, meu orgulho é Costa Rica.

Croácia

Com fogo em nossos corações, pela Croácia, todos por um.

Equador

Um compromisso, uma paixão, um coração. Isto é por você, Equador.

Espanha

Dentro de nossos corações, existe a paixão de um campeão.

Estados Unidos

Unidos por um time, guiados pela paixão.

França

Impossível não é uma palavra em francês.

Gana

Estrelas Negras: aqui para iluminar o Brasil.

Grécia

Os heróis jogam com os gregos.

Holanda

Homens de verdade vestem laranja.

Honduras

Somos um povo, uma nação, cinco estrelas no coração.

Inglaterra

O sonho de um time, as batidas do coração de milhões.

Irã

Honra da Pérsia.

Itália

Vamos pintar o sonho da Copa do Mundo de azul.

Japão

Samurai, chegou a hora de lutar.

México

Sempre unidos, sempre astecas.

Nigéria

Só juntos podemos vencer.

Portugal

O passado é história, o futuro é a vitória.

Rússia

Ninguém pode nos capturar.

Suíça

Estação final: 13/07/2014 – Maracanã.

Uruguai

O sonho de três milhões... Vamos, Uruguai!