Contemplando as Palavras

Bela, sempre bela língua portuguesa

15 de Marco de 2009, por Regina Coelho 0

Falei sobre a língua portuguesa na edição de janeiro deste ano. Mencionei nomes de alguns dos nossos muitos autores através de quem foram escritas belas e inesquecíveis palavras. São inúmeras páginas reveladoras do pensamento e do sentimento do artista de alma lusitana. Por gosto pessoal e considerando momentos distintos da história, selecionei algumas delas. Aprecie!

SONETO
Amor é um fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
(Luís de Camões)


HAVEMOS DE VOLTAR
Às casas, às nossas lavras
às praias, aos nossos campos
havemos de voltar.

Às nossas terras
vermelhas do café
brancas do algodão
verdes dos milharais
havemos de voltar.

Às nossas minas de diamantes
ouro, cobre, de petróleo
havemos de voltar.

Aos nossos rios, nossos lagos
às montanhas, às florestas
havemos de voltar.

À frescura da mulemba
às nossas tradições
aos ritmos e às fogueiras
havemos de voltar.

À marimba e ao quissange
Ao nosso carnaval
havemos de voltar.

À bela pátria angolana
nossa terra, nossa mãe
havemos de voltar.

Havemos de voltar
À Angola libertada
Angola independente.
(Agostinho Neto, Cadeia do Aljube, outubro de 1960)


MOMENTO NUM CAFÉ
Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.

Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta.
(Manuel Bandeira)


FUMO
Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas...
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces, plenas de carinhos!

Os dias são outonos: choram... choram...
Há crisântemos roxos que descoram...
Há murmúrios dolentes de segredos...

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!
E ele é, ó meu Amor, pelos espaços,
Fumo leve que foge entre os meus dedos!...
(Florbela Espanca)


A letra A a
Funda no A
tlântico
e pacífico com
templo a luta
entre a rápida letra
e o oceano
lento

assim
fundo e me afundo
de todos os náufragos
náufrago
o náufrago
mais
profundo.
(Paulo Leminski) – Sugestão de Eni Penha


ISMÁLIA
Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir no céu,
Queria descer no mar...

E no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...
(Alphonsus de Guimaraens)

Reformando o português...

07 de Fevereiro de 2009, por Regina Coelho 1

O Brasil acordou no primeiro dia de 2009 escrevendo de outra maneira algumas palavras. É o que reza o acordo ortográfico firmado em 1990 pelos integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) – Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Guiné- Bissau. O Timor Leste, jovem país asiático, também assinou, depois, o acordo de unificação da grafia da língua portuguesa, mas os prazos de implantação das novas regras não foram cumpridos. Por falta de adesão de Portugal às medidas, o governo brasileiro veio adiando as mudanças. Essa situação perdurou até março de 2008, quando Lisboa anunciou o desejo de aderir à reforma. Em setembro do mesmo ano, o presidente Lula assinou decreto com o cronograma de aplicação do acordo no país, segundo o qual os brasileiros terão quatro anos para se adequar às novas regras.

De imediato, como não poderia deixar de ser, já se vê a aplicação da nova ortografia por parte da imprensa escrita. Palavras como “ideia”, “plateia”, “voos”, tão usuais nos textos jornalísticos, aparecem hoje sem os seus outrora obrigatórios acentos gráficos. O trema, que muita gente já tinha abolido por conta própria, deixou de existir, mantendo-se somente em nomes próprios estrangeiros e derivações. Devo dizer que, dia desses, ao fazer uma singela lista de compras e incluir nela o item “linguiça” assim, sem o trema, conforme prevê o referido acordo, estranhei o termo. Pudera! Minha condição de professora de português me fez defender os tais dois pontinhos sobre o “u” (güe, güi, qüe, qüi) e, evidentemente cobrar dos alunos a aplicação deles. Inversamente ao destino do trema, as letras k, w e y, vistas como intrusas, mas usadas assim mesmo, fizeram crescer o nosso alfabeto, agora com 26 letras. A dificuldade quanto ao uso do hífen continua. Por exemplo, o que antes era “anti-social” (com hífen) virou “antissocial” (sem hífen e com o “s” dobrado). Contrariamente, “antiinflamatório” (grafia antiga) virou “anti-inflamatório”. A explicação para isso a gente confere ainda na coluna deste mês. E havia também os acentos diferenciais em palavras como “pêra”, “pêlo”... (substantivos) que viraram “pera”, “pelo”... Caíram quase todos. Mantém-se o acento circunflexo de “pôde” e do verbo “pôr”.

Desnecessária, dispendiosa, insignificante ou acertada, a reforma ortográfica, que altera cerca de 2% das nossas palavras, é polêmica, mas acima de tudo, é hoje uma realidade. Vocês conhecem aquela história do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”? Pois é, obedeçamos! Uma consulta ao texto da jornalista Dad Squarisi, editora de Opinião do “Correio Brasiliense” e autora do “Manual de Redação e Estilo dos Diários Associados” e de outros livros, esclarece os pontos básicos sobre as novas normas gráficas da língua portuguesa. Eis o que o resumo diz:


O QUE MUDA?

1- Alfabeto: com a entrada do k, w e y, passa a ter 26 letras.

2- O trema desaparece. Freqüente, tranqüilo, lingüeta, lingüiça & cia. passam a se escrever frequente, tranquilo, lingueta, linguiça, (mesmo sem o trema, a pronúncia se mantém).

3- O chapéu do ditongo ôo se despede: vôo, abençôo e perdôo viram voo, abençoo e perdoo.

4- O circunflexo do hiato êem (que aparece na 3ª pessoa do plural dos verbos ler, ver, crer, dar e derivados) diz adeus: eles lêem, vêem, crêem, dêem, relêem & cia. se grafarão eles veem, creem, deem, releem.

5- O agudão do u tônico dos verbos apaziguar, averiguar, argüir. Vai plantar batata na esquina: apazigúe, averigúe, argúem se escreverão apazigue, averigue, arguem.

6- O i e u antecedidos de ditongo perdem o grampo. Feiúra vira feiura; baiúca, baiuca; Sauípe, Sauipe.

7- Os ditongos abertos éi, ói viram ei, oi: idéia e jóia se escreverão ideia, joia.

Abra os olhos: só o grampinho das paroxítonas se vai. O das oxítonas e o dos monossílabos tônicos permanecem firmes e fortes: papéis, herói, dói.

8- Os acentos diferenciais usados em pêlo, pélo, pára, pólo, pêra & cia. se vão. As palavras ganharão forma mais leve: pelo, para, polo, pera.

Atenção, atenção! Mantém-se o chapéu de pôde e do verbo pôr (monossílabo).

9- Exigem o hífen:

9.1- Além, aquém, ex, pós, pré, pró, recém, sem, vice: além-mar, aquém-muros, ex-presidente, pós-graduação, pré-primário, pró-reitor, recém-chegado, sem-terra, vice-presidente.

9.2- Os prefixos seguidos de h: anti-higiênico, super-homem, micro-história, extra-humano, co-herdeiro, proto-história, sobre-humano, ultra-heróico.

Exceção: subumano.

9.3- Os prefixos terminados em vogal seguidos por palavra começada pela mesma vogal: anti-inflamatório, auto-observação, contra-ataque, micro-ondas, semi-internato.

Exceção: co- se junta ao segundo elemento mesmo quando ele acaba com o: coordenar, coobrigação.

9.4- O prefixo terminado por consoante seguido por palavra começada pela mesma consoante: hiper-rico, inter-racial, sub-bloco, super-resistente, super-romântico. (O sub vai além. Usa hífen com palavra iniciada por r: sub-região, sub-raça).

Os sufixos de origem tupi-guarani açu, guaçu e mirim: amoré-guaçu, anajá-mirim, capim-açu.

10- Rejeitam o hífen:

10.1- Os prefixos terminados em vogal diferente da vogal com que se inicia o segundo elemento: aeroespacial, agroindústria, antieducação, autoescola, coedição, coautor, infraestrutura, plurianual, semiopaco.

10.2- Os prefixos terminados em vogal que se juntam a palavras começadas por r ou s. No caso, duplicam-se o r e o s pra manter a pronúncia: antirrábico, antirrugas, antissocial, biorritmo, contrassenso, infrassom, microssistema, minissaia, multissecular, neossocialismo, semirrobusto, ultrarrigoroso.


Atenção, muita atenção

A reforma é ortográfica, só atinge acentos e letras. Pronúncias, concordâncias, regências, flexões, etc. e tal estão fora. Não foram nem sequer arranhadas.
Apenas as paroxítonas sofreram alteração nos acentos. As oxítonas, as proparoxítonas e os monossílabos tônicos permanecem com a grafia de sempre. Vale lembrar: trema não é acento.


SIM, NÓS FALAMOS PORTUGUÊS

Sediada em Lisboa, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é uma organização criada em 1996 que congrega os países de língua oficial portuguesa com o objetivo de aumentar a cooperação e o intercâmbio cultural entre seus membros e uniformizar e difundir o idioma de Camões.

Formamos um contingente expressivo. Somos mais de 230 milhões de lusófonos (falantes do português) espalhados em quatro continentes. Da referência ao tradicional bacalhau, passando pelos belíssimos azulejos, alguns dos símbolos de Portugal tão apreciados por nós, é mesmo pela língua lusitana que nos identificamos como irmãos. E mais ainda pela arte literária de um idioma que abrange nomes como os de Eça de Queirós, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, José Saramago. De brasileiros como Machado de Assis, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira. E há também uma nova e vigorosa literatura africana produzida em língua portuguesa representada por autores que vão de Agostinho Neto e José Luandino Vieira (Angola) José Craveirinha e Mia Couto (Moçambique) a Alda Espírito Santo (São Tomé e Príncipe), entre outros.

Consta que o espanhol Miguel de Cervantes, célebre autor de “Dom Quixote”, teria qualificado de “doce e agradável” a nossa língua materna. “A última flor do Lácio” de Bilac se traduz perfeitamente por ninguém menos que Clarice Lispector: “SOU BRASILEIRA NATURALIZADA, QUANDO POR UMA QUESTÃO DE MESES, PODERIA SER BRASILEIRA NATA. FIZ DA LÍNGUA PORTUGUESA A MINHA VIDA INTERIOR, O MEU PENSAMENTO MAIS ÍNTIMO. USEI-A PARA PALAVRAS DE AMOR”.

Segundo tempo esportivo

11 de Janeiro de 2009, por Regina Coelho 2

Alcebíades de Magalhães Dias, árbitro mineiro nas décadas de 40 e 50, entrou para a galeria dos tipos inesquecíveis do futebol brasileiro em virtude de um episódio pitoresco ocorrido em uma das inúmeras partidas em que atuou. Jogavam Atlético Mineiro e Botafogo, até que a bola saiu pela lateral. Foram dois jogadores, um de cada time, perguntar ao juiz de quem era a posse de bola. Prontamente, ele respondeu ao zagueiro do Galo, então chamado de beque:

- É nossa, Afonso, é bola nossa!

Essa frase o acompanhou pelo resto da vida e virou extensão de seu nome, fazendo nascer o folclórico Cidinho Bola Nossa, um atleticano ‘‘autêntico, mas não fanático’‘, como ele mesmo se definiu.

O caso narrado acima e tantos outros compõem um anedotário digno de figurar em intermináveis conversas envolvendo os apaixonados pelo esporte número 1 do país. Acompanhem esta outra história:

Numa viagem aérea do time do Flamengo, Renato Gaúcho, muito gozador, diz para Fábio Baiano:

- A aeromoça, além de bonita, fala inglês e espanhol, porque é ‘‘troglodita’‘.

Muito galanteador, Fábio Baiano chega-se à aeromoça e cheio de sorrisos lhe diz:

- A senhora, além de bonita, é uma troglodita muito inteligente.

Ainda seguindo a linha da troca de palavras, recordo Joel Santana, quando técnico do Botafogo, ao afirmar:

- Afastei o Alexandre porque resolvi ‘‘privatizar’‘ a disciplina.

E tem aquela explicação de um dirigente do Santos:

- Não vamos trazer mais nenhum jogador. Acabou o ‘‘circo’‘ de contratações.

Em se tratando do que disse um desses repórteres de gramado, só pode ter sido o sol escaldante o culpado pela ligeira confusão:

- Está fazendo um calor ‘‘ensurdecedor’‘.

Não posso cometer a injustiça de deixar de citar o lendário Vicente Matheus, que foi presidente do Corinthians por oito mandatos. Matheus produzia máximas (alguns dizem que propositadamente) carregadas de incorreções e que divertiam amigos e desafetos. Selecionei as seguintes:

- Vou dar uma ‘‘anestesia’‘ geral para os sócios com mensalidade atrasada.

- Jogador tem que ser completo, tem que ser como o pato, que é aquático e gramático.

- O Sócrates é invendável e imprestável.

- O difícil, como todos sabem, não é fácil.

Todos nós, os amantes do futebol, também sabemos que ‘‘Clássico não tem favorito’‘; ‘‘Todo grande time começa com um grande goleiro’‘; ‘‘Treino é treino, jogo é jogo’‘; ‘‘Em time que está ganhando não se mexe’‘ e o máximo das máximas: ‘‘O FUTEBOL É UMA CAIXINHA DE SURPRESAS’‘.


UM CRAQUE NO FUTEBOL DE RESENDE COSTA

O que de certa forma prometi, na edição passada, penso ter cumprido no artigo acima. Tenho de reconhecer, porém, que ando inclinada a continuar falando das histórias sobre o futebol, agora tratando desse esporte em Resende Costa, envolvendo outras épocas.

Consultando a obra de Gentil Vale, o autor de ‘‘Visões Perdidas’‘ faz uma primeira referência ao Resendino, time que brilhou no campo do Alfredo Macedo (farmacêutico e meu tio-avô materno). O campo em questão é a área hoje ocupada pelo Lar São Camilo. Em seguida, ele cita o Operário. Segundo Gentil, foi ‘‘sem dúvida, o mais famoso e brilhante de todos. Seu campo ficava no Pau-de-Canela, perto do cruzeiro. (...) Este time muito raramente perdia dentro e fora de Resende Costa. Deu muita alegria ao povo’‘. Ainda de acordo com o nosso escritor, ‘‘outro que também teve sua trajetória brilhante e que muitos triunfos conquistou foi o Resende Costa Esporte Clube’‘. Os jogos do time tinham como cenário o campo do pasto do Mané Cassiano (pai da Nenega do Célio Ramos), porque o do Pau-de-Canela havia sido desativado. E mais: ‘‘Lá pelo início da década de 40 surgiu o Expedicionário Esporte Clube, sob a presidência do ‘Sô Bico’, como era popularmente conhecido o senhor Olinto Argamim de Freitas e cujo nome batiza, com justiça, o principal campo de futebol da cidade’‘.

Especificamente no que diz respeito a esse nosso antigo cartola, que era dentista de profissão, o mesmo Gentil, em sua obra ‘‘Estrelas Cadentes’‘, destaca o seguinte: ‘‘Seu esporte favorito era o futebol, e, por longo tempo, foi presidente das agremiações esportivas resende-costenses. Entregava-se de corpo e alma ao esporte bretão, para cujo sucesso gastava muito dinheiro de seu próprio bolso’‘. E também afirma que, entre os filhos, ‘‘Totonho, Ari, Hélio e Iraci foram verdadeiros craques de futebol’‘. E que ‘‘time de que faziam parte muito raramente perdia’‘.

Evidentemente, muitos outros nomes brilharam ao longo dos anos por nossos gramados e os das cidades vizinhas. Não tenho a pretensão de saber quem foi o nosso melhor jogador. Deixo isso para os mais entendidos no assunto e os mais vividos, quem sabe através de uma pesquisa popular? Nada disso me impede, no entanto, de apontar o Iraci da dona Olga como o nosso craque. Não o vi jogar e confesso que sou suspeitíssima para falar dele por uma razão de fundo sentimental: a bela amizade de uma vida inteira que o uniu a meu pai desde a infância de ambos, tornando o ‘‘compadre Iraci’‘ uma pessoa muito querida de todos na minha casa. Sentimentalismos à parte, recorri a algumas fontes fidedignas para que pudessem se manifestar sobre essa questão . Não deu outra. Obtive ainda a informação de que o Iraci teve a chance de jogar no Flamengo, mas como jogador de futebol, naquela época, não desfrutava do status que tem hoje e a profissão era vista com certa reserva pela sociedade, ‘‘Sô Bico’‘ decidiu que o filho não ficaria no Rio.

Nos dias atuais, como legítimo representante da novíssima geração da família Freitas, está aí o Vítor, filho da Ana Maria e neto do Iraci, revelando-se um garoto muito bom de bola. Com certeza, há outros meninos como ele. Precisamos descobri-los, dando-lhes oportunidade de construir novas e bonitas histórias ligadas ao futebol de Resende Costa.


PARA REFLETIR

VIDA
A vida são deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê já são seis horas! Quando se vê, já é sexta-feira...
Quando se vê, já terminou o ano... Quando se vê, passaram-se 50 anos!
Agora, é tarde demais para ser reprovado...
Se me fosse dada, um dia, outra oportunidade, eu nem olharia o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho,
a casca dourada e inútil das horas...
Desta forma eu digo, não deixe de fazer
algo que gosta devido à falta de tempo,
a única falta que terá será desse tempo,
que infelizmente não voltará mais.
(Fragmentos)
Mário Quintana

Microfones a postos

07 de Dezembro de 2008, por Regina Coelho 0

‘Sabemos que será um jogo muito difícil, mas confio muito no nosso grupo e faremos de tudo para sair com a vitória.’

‘Nada está decidido. É assim que temos de pensar, pois temos de estar mais concentrados do que nunca.’

‘Sei do meu potencial e, se o Professor precisar de mim, estou pronto para jogar.’

‘Vamos voltar para o segundo tempo com força total e reverter esse placar.’

‘Nós até que conseguimos marcar bem, mas falhamos em duas jogadas de bola parada.’

‘Eu juntamente com meus companheiros...’.

Essas e outras falas parecidas são construções lingüísticas largamente utilizadas pelos nossos atletas do futebol, respectivos treinadores e dirigentes no exercício de seu trabalho junto à imprensa. Indagados sobre o porquê de dizerem as mesmas coisas, muitos jogadores, os verdadeiros astros do esporte, por isso mesmo os mais visados, costumam se defender, dizendo que as perguntas são as mesmas, daí... Sobrou para os repórteres, mas a fama de falar coisas, digamos assim, óbvias, é do pessoal que faz a festa nos gramados brasileiros. E para nós é isso que interessa. Queremos é ver gols, belas jogadas e títulos, é claro, de preferência para o nosso time. É exigir muito que esses profissionais dominem o vernáculo. Como isso é possível se a grande maioria abandona cedo os bancos da escola para correr atrás de uma bola e do sonho de fazer a vida como jogador de futebol? Deles queremos que se revelem craques da bola e façam a alegria das torcidas, cumprindo bem o papel que lhes é reservado, o de donos do espetáculo.

Dito isso, devo admitir, no entanto, que não resisto a repassar algumas frases famosas pertencentes ao lado folclórico do esporte mais popular do país. Vamos a elas:

‘Somente três coisas param no ar: o beija-flor, o helicóptero e o Dadá.’
‘É Deus no céu, o Papa no Vaticano e o Dadá na grande área.’
‘Não me venham com a problemática que eu tenho a solucionática.’
(Dadá Maravilha, um dos grandes ídolos do Atlético)

‘Clássico é clássico e vice-versa.’ (Jardel, ex-atacante, do Grêmio)

‘Quem nunca agrediu uma mulher?’ (Josimar, ex-lateral do Botafogo)

‘Graças a Deus tive sucesso tanto na minha vida futebolística quanto na minha vida humana.’ (Nunes, ex-centroavante do Flamengo)

O mesmo Josimar, agora em situação mais amena, ao ser perguntado sobre o que achou de um certo jogo, saiu-se com esta:

-Bom, eu não achei nada, mas o meu companheiro ali achou uma correntinha, acho que é de ouro, dá para ele vender.

De uma outra vez, indagado pelo repórter de campo sobre o que faria com o Motorádio que iria receber como o melhor jogador em campo, disparou:

- A moto eu vou vender e o rádio vou dar para minha tia.
Já Claudiomiro, do Internacional, chegando a Belém (PA) para enfrentar o Paissandu, em 1972, teria dito:

- Tenho o maior orgulho de jogar na terra onde Jesus nasceu.

Surpreendente é este comunicado de Mengálvio, ex-meia do Santos, em telegrama mandado à família, quando em excursão à Europa:

- Chegarei de surpresa dia 15, às 2 da tarde, vôo 619, da VARIG.

E tem aquela do Ivair, ex-centroavante da Portuguesa, entrevistado por um daqueles repórteres de beira de gramado:

-Muita gente, muita chuva, muito obrigado!

E o Elivélton, um dos ciganos do futebol, aquele de quem os cruzeirenses se lembram bem, falando sobre a quantidade de faculdades existentes em sua cidade natal:

-Realmente, minha cidade é muito facultativa.

E tem ainda o Vladimir, ex-lateral do Corinthians, em entrevista à Rádio Record:

- Eu disconcordo de você.

Esta é mais recente. O zagueiro Fabão, ao ser contratado pelo Flamengo, não vacilou:

- A partir de agora, meu coração só tem uma cor: é rubro-negro.

Contam também que Pelé, perdido em meio a inúmeros garotos amontoados à sua volta tentando conseguir autógrafos do rei, ouviu esta de um colega:

-Isto aqui até parece um cardume de abelhas.

Fazer confusão com as palavras pode ser mesmo um perigo. Comprovem.
O volante Mingão, do Noroeste de Bauru, candidatou-se a vereador e, em um comício, tascou, empolgado:

-Se eleito, prometo apedrejar todas as ruas da cidade.

Outra do Nunes (lembram-se dele?) deixando o campo, contundido. O repórter pergunta se a contusão é grave. Ele simplesmente responde:

-Não, meu estado não inspira gravidez, não.

E outra do Jardel falando de sua preferência por partidas decisivas:

-Quando o jogo está a mil, minha naftalina sobe.

E tome mais troca de palavras. Um certo Luciano, jogador do juvenil da Portuguesa Santista, reclamando com o juiz sobre um gol anulado por impedimento, garantiu:
-Seu juiz, eu juro que o gol foi legível.

E também um certo Celinho, jogador do interior paulista, não deixou por menos:

-Nosso time é experiente, cheio de jogadores carimbados.

Um primor também foi o que disse Camilo (quem?), ex-zagueiro do Santos, deixando o campo e apertando fortemente a coxa:

-Estou sentindo uma figada na pantuvilha.

Não poderia faltar uma contribuição portuguesa, com certeza, ou melhor, duas, vindas do atleta João Pinto, antigo jogador da seleção de Portugal. A primeira:

-Não foi nada especial, só chutei com o pé que estava mais à mão.

A outra:

-Bem, a equipe estava à beira do abismo. Agora, graças a Deus, deu um passo adiante.

Pois é. Poupei os treinadores, os cartolas, juizes e mesmo os repórteres, por enquanto, só por enquanto. Afinal, ninguém está livre de produzir uma daquelas pérolas memoráveis. E vou ficando por aqui lembrando uma frase genial do artilheiro Dadá: NÃO EXISTE GOL FEIO, FEIO É NÃO FAZER GOL. Concordo com ele em gênero e número igual , ops!, em gênero, número e grau.

No reino da criação

16 de Novembro de 2008, por Regina Coelho 0

Gérson, meia armador da seleção brasileira de futebol que se sagrou tricampeã na Copa do Mundo de 1970, no México, protagonizou em 1976 uma propaganda que veio a lhe render mais tarde muita dor de cabeça. Nela, o ‘‘Canhotinha de Ouro’‘ aparecia anunciando os cigarros ‘‘Vila Rica’‘ e defendendo a marca do produto, que dizia ser melhor e mais barata que as outras. Como arremate, ele afirmava: ‘‘Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Por isso fumo Vila Rica. Leve vantagem você também’‘. Gérson, algum tempo depois, confessou arrependimento de ter associado sua imagem ao anúncio, visto que qualquer comportamento pouco ético foi sendo aliado ao seu nome através do que se convencionou chamar ‘‘Lei de Gérson’‘. Em outras palavras, a fala do então jogador virou sinônimo de tirar proveito próprio de todas as situações, sem preocupações morais. O que parecia uma simples propaganda, apesar de ter como personagem central um jogador profissional assumidamente fumante, coisa impensável nos dias de hoje, marcou a biografia de Gérson, que deve ser lembrado muito mais pela excepcional qualidade do futebol que jogou.

Por outras razões, bem mais felizes, diga-se de passagem, a história mais ou menos recente da propaganda brasileira registra peças que também marcaram época, consagraram marcas e elevaram o conceito dos profissionais do setor, como comprovam as premiações até internacionais a que fizeram jus nossos publicitários.

Numa extensa lista de trabalhos inesquecíveis, há aqueles que conquistam também pela música que divulga o anunciante. Muita gente ainda hoje se lembra daquele belo anúncio de Natal do Banco Nacional (que nem existe mais) em que um coral de vozes infantis entoava: ‘‘Quero ver você não chorar, não olhar pra trás, nem se arrepender do que faz...’‘ E aquele da Varig e também anúncio natalino? ‘‘Estrela brasileira no céu azul, iluminando de Norte a Sul...’‘ E o da Vasp?: ‘‘... A Vasp abre suas asas com a ternura, para você ganhar altura, viajar.’‘ O Bamerindus virou HSBC, mas o jingle antigo do banco permanece na memória: ‘‘O tempo passa, o tempo voa, e a poupança Bamerindus continua numa boa’‘. Não dá para esquecer o Guaraná Antarctica, que, fazendo dobradinha com a pizza ou com a pipoca é sempre recomendado: ‘‘Eu não vejo a hora de te cortar, te ver mais uma vez, te saborear... Adoro pizza com guaraná.’‘ ‘‘Pipoca na panela começa a rebentar. Pipoca com sal, que sede que dá. Pipoca e guaraná, que programa legal’‘. Nesses anúncios que aguçam o paladar, nem preciso dizer que as imagens são irresistíveis. E quem esquece as crianças vestidas de bichinhos mamíferos nos comerciais da Parmalat?: ‘‘O elefante é fã de Parmalat...’‘ Garanto também que ficou guardado o seguinte: ‘‘Quem bate? É o frio. Não adianta bater, que eu não deixo você entrar. Nas Casas Pernambucanas é que vou aquecer o meu lar...’‘

Há uma outra categoria de comerciais cujo mérito maior é criar bordões, frases que o povo passa a adotar. Alguns exemplos: ‘‘O importante é ter Charm.’‘ (marca de cigarro). ‘‘Tomou Doril, a dor sumiu.’‘ (analgésico). ‘‘Sempre cabe mais um quando usa Rexona’‘ (desodorante). ‘‘Não basta ser pai, tem que participar.’‘ (Gelol). ‘‘Compre batom. Seu filho merece Batom.’‘ (chocolate). ‘‘Ei, ei , você se lembra da minha voz? Continua a mesma. Mas os meus cabelos, quanta diferença!’‘ (Xampu Colorama).

Pela criatividade e sensibilidade, fica impossível não citar um comercial da Valisère, de 1987, que consagrou a então desconhecida Patrícia Luchesi, incorporando a garota que vê chegar a adolescência. A frase final ‘‘O primeiro sutiã a gente nunca esquece’‘ simboliza exemplarmente esse rito de passagem. Outra garota, a do refrigerante Sukita, em anúncio bem mais recente, entra no elevador e desconcerta o rapaz já maduro que tenta puxar papo com ela (ocupada com seu refri). O clima possível de paquera ou interesse por parte dele é quebrado com um singelo pedido dela: ‘‘Tio, aperta o 21 pra mim?’‘

E há os garotos-propaganda. Um deles é o insuperável garoto Bombril. Carlinhos Moreno está presente no livro dos recordes como o mais antigo garoto-propaganda de uma mesma marca. Foram 26 anos de exclusividade e o surgimento de uma vasta galeria de personagens ligados aos produtos ofertados. Uma história de verdadeiro sucesso. Longe de ser unanimidade, quem não se lembra do ‘‘Quer pagar quanto?’‘ Ou melhor, quem não se lembra do Fabiano Augusto? Para muitos é aquele chato das Casas Bahia. E não pode faltar o cachorrinho Cofap, não exatamente um garoto, mas um cão comprido e de pernas curtas (um Dachshund ou Teckel, segundo minhas pesquisas) defendendo a marca de amortecedores por cujo nome aquele cãozinho esperto dos anos 89 a 93 ficou conhecido.

Sem maiores aprofundamentos, é oportuno dizer ainda que a força de certas marcas faz com que elas, em algum momento, se transformem metonimicamente em sinônimos do próprio produto. Assim, Gillete (= lâmina de barbear), Brahma (= cerveja) e Bombril (= palha de aço). E quem não associa o termo Brastemp ao que há de melhor? Coisas do mundo da propaganda.


PRESENTE PARA RESENDE COSTA

Entregue oficialmente ao público no último dia 31, o novo espaço da Biblioteca Municipal de Resende Costa é um orgulho para a cidade, que há muito reivindicava um local que pudesse abrigar em condições dignas e à altura de uma de suas mais importantes instituições todo o acervo de que ela dispõe. O que se espera é que o imponente prédio recém-construído seja um marco na vida cultural de Resende Costa, aliando a boa tradição que nossa biblioteca representa ao moderno que naturalmente se impõe. Fazer de suas amplas e confortáveis instalações um atuante, dinâmico e adequado centro do saber é o desafio que agora se apresenta. Afinal de contas, bibliotecas são organismos vivos onde a história se constrói diariamente e se conserva para os que nos sucederão.


FESTIVAL DE CULTURA

Em razão do fechamento dessa coluna exatamente na semana do Festival de Cultura/2008, não foi possível comentar sobre o evento na presente edição. É necessário que iniciativas dessa natureza se mantenham. A cidade agradece.